Translate

terça-feira, 9 de agosto de 2016

A Janela da Alma e a cura

A janela com o sagrado, com o divino, abre-se de diversas maneiras. Ás vezes naturalmente, dependendo do estado de espírito da pessoa, ou muitas vezes, como é mais comum,  provocadas por drogas alucinógenas ou mesmo por enteógenos, que  alteram a consciência e induz ao estado de êxtase.

A palavra "enteógeno", que significa, literalmente, "manifestação interior do divino", deriva de uma palavra grega obsoleta da mesma raiz da palavra "entusiasmo" e que se refere à comunhão religiosa sob efeito de substâncias visionárias, ataques de profecia e paixão erótica. Este termo foi proposto como uma forma elegante de nomear estas substâncias, sem tachar pejorativamente costumes de outras culturas.

O uso de plantas (ou fungos) para alteração da consciência e percepção é uma realidade mundial e milenar. Até mesmo animais usam plantas com atividade psicotrópica, como é o caso de javalis e primatas que cavam para conseguir as raízes do poderoso Tabernanthe iboga, ou simplesmente iboga, que  é um arbusto perene nativo do oeste da África  Central onde a planta cresce, a casca da raiz é mastigada para diversos fins farmacológicos ou ritualísticos.

Outra planta usada pelos animais é a Marula, árvore nativa da África, que ao fermentar no estômago doa animais o deixam bêbados. Aparentemente, os fãs número um da fruta são os elefantes — inclusive são eles os “garotos propaganda” do conhecido licor cremoso —, embora ela seja muito apreciada por outros animais também, como macacos, girafas e avestruzes. Reza a lenda que a bicharada se alimenta das marulas supermaduras e em processo de fermentação que caem das árvores, ficando bêbada. Clique no filme abaixo.


Se bem que o alcool como elemento para abrir a janela da alma seja discutível, precisamos entender que ele causa frisson e muitas vezes pessoas que o usam, tornam-se mais abertas em seus pensamentos. A árvore marula, um membro da mesma família como a manga, cresce amplamente na África. Sua doce fruto, amarelo é usado para fazer compotas, vinho, cerveja, e um licor chamado Amarula.

Mas voltemos para a planta Tabernanthe iboga. Preparados com essa planta vem sendo utilizado, com sucesso, em sessões terapêuticas no Hospital Terapêutico do Grupo VIDA cujo objetivo é alcançar a cura completa da drogadição. Observe-se que não são os mesmos extratos utilizados nas distintas tribos, pois segundo a referida antropóloga são preparados mantidos em sigilo.

A ibogaína é talvez a droga alucinógena mais impressionante de que se tem notícia. Não bastassem seus efeitos avassaladores sobre a consciência – induz o coma, provoca visões e muda a vida de quem a consome, segundo eles mesmos –, essa raiz africana pode curar a dependência de outras drogas. Ela é uma das substâncias mais perigosas que se conhece – muita gente já morreu por sua causa. A antropóloga paulista Beatriz Labate, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), viajou a Camarões para conhecer de perto a ibogaína. Eis o seu relato – o primeiro do tipo escrito por um brasileiro:

A iboga (raiz cujo princípio ativo é a ibogaína) é utilizada na África Central no tratamento de depressão, picada de cobra, impotência masculina, esterilidade feminina, Aids e também como estimulante e afrodisíaco. Os curandeiros locais, adeptos de uma religião chamada bouiti, acreditam que ela é eficaz também contra doenças místicas, como a possessão.

“Tonye Mahop, pesquisador do Jardim Botânico de Limbe, conta que ‘existem vários registros de cura da dependência de cigarro, maconha e álcool com a iboga. O problema é que os informantes não contam bem como preparam e usam a planta. Tem uma parte do conhecimento que fica sempre em segredo.’

O ritual de iniciação, no qual a substância é ingerida, dura três dias. Na abertura, o candidato confessa todos os seus pecados e toma um banho ritual. Depois ele come em jejum até meio quilo da planta. Um grupo o acompanha cantando e dançando noite adentro. A iniciação tem como objetivo induzir um coma. De acordo com os praticantes, em algum momento o espírito sai do corpo e viaja para o ‘lado de lá’. Ou seja, visita o mundo dos mortos. Pode receber revelações, curas ou se comunicar com seus ancestrais. Terminada a cerimônia, a pessoa ‘renasce’ com uma nova identidade – bandzi, ou ‘aquele que comeu’. A anciã Bilbang Nga Owono Christine, lembra bem a sua iniciação, quando teria se curado de uma ‘doença nos olhos’: ‘Uma estrela me guiou até um hospital no lado de lá. Vi meu espírito saindo do meu corpo e os médicos me operando. Voltei curada’, diz.

Podem ocorrer mortes nos rituais se a dose for grande demais ou se o sujeito estiver debilitado. Da mesma forma, três pessoas já morreram no tratamento não-controlado de toxicodependentes com ibogaína na Holanda, na França e na Suíça. Alguns especialistas afirmam que a ibogaína age sobre áreas do cérebro que regem a sensação do corpo físico. O resultado é que a pessoa constrói uma imagem do ‘eu’ fora do corpo. Os relatos de alguns iniciados se assemelham muito aos de pessoas que estiveram perto da morte. Em ambos os casos, fala-se na presença de uma luz infinita que seria a própria divindade, no encontro com mortos, na vida inteira passando diante dos olhos.

Participei de uma iniciação, mas comi apenas uma colherinha de iboga. O efeito foi fortíssimo, durou 24 horas. Não posso dizer que entendi muita coisa, além de ter achado o ritual bastante cansativo. A sensação foi de que os nativos têm razão: a iboga é qualquer coisa que não tem a ver com este mundo, diz respeito ao mundo dos mortos. Ficou apenas uma enorme curiosidade – e medo – de me submeter à iniciação completa.”

Quimicamente, a ibogaína é classificada como uma triptamina, análoga à melatonina, estruturalmente semelhante à harmalina. Um dos primeiros pesquisadores a estudar os potenciais efeitos da ibogaína psicoterápico foi o psiquiatra chileno Claudio Naranjo, na década de 1960s e segundo Freedlander, 2003 o uso da ibogaína para o tratamento da dependência de drogas tem sido baseada em relatos da International Coalition of Addict Self-Help (ICASH) e DASH (Dutch Addict Self-Help Group) de pesquisas realizadas com voluntários desde os anos 80. [5] Estudo feito pela Universidade Federal de São Paulo mostrou que a ibogaína é cinco vezes mais eficiente para interromper a dependência química do que tratamentos já conhecidos. É extraída da raiz da Iboga.

Em Tsogo o verbo boghaga significa “cuidar de”. Na etnomedicina Africana, mais especificamente no Gabão e Camarões, uma planta especial recebeu o nome de eboghe, ou iboga (ou ainda eboga). Para cientistas ocidentais, a planta pertence à família Apocynacae, e recebeu o nome de Tabernanthe iboga. A raiz da iboga é usada há muito tempo em rituais xamânicos da cultura Bwiti para diagnosticar doenças e tratar males da alma. Com elas, os xamãs e os iniciados fazem viagens a reinos incomuns e contactam espíritos, antepassados e obtém informações úteis para o grupo social em que vivem. bwiti-mougongoNo final do século XIX, durante a colonização da África pelas potências Européias, chegaram na França os primeiros relatos sobre o xamanismo Bwiti. E um exemplar da planta foi coletado na região do Gabão e do Congo por um médico da marinha Francesa. E logo no início do século XX, em 1901, uma molécula foi isolada e cristalizada a partir do extrato da raiz e recebeu o nome de ibogaína. Entre 1939 e 1966 um extrato da planta Tabernanthe manii, que também contém a molécula ibogaína, foi comercializado em comprimidos na França. Era vendido e utilizado principalmente por atletas que o utilizavam como estimulante, que supostamente também aumentava a produção de glóbulos vermelhos no sangue. Mas foi justamente na época em que o Lambarene saiu do mercado Francês que o uso mais intrigante e promissor da ibogaína foi descoberto. E de maneira totalmente inesperada.

Howard Lotsof era um usuário de psicoativos, e com os amigos gostava de experimentar vários tipos de drogas. Usavam bastante opiáceos, sendo alguns do grupo viciados nas drogas. Certo dia compraram ibogaína de um comerciante, que lhes prometeu uma viagem muito mais louca e forte que qualquer outra coisa. E ele estava certo. O grupo tomou suas doses de ibogaína e alguns tiveram, provavelmente, a viagem mais longa e louca de suas vidas. Profundas alterações na consciência, rememoração de toda a vida e visões de cores, fractais, caleidoscópios e alienígenas são alguns dos efeitos relatados por usuários até hoje. Mas o efeito mais surpreendente de todos só foi notado depois, por Howard Lotsof. Apesar de ser usuário diário de opiáceos, ele só pensou novamente em usar heroína uns 3 dias após a experiência com a ibogaína. E quando isso aconteceu, ele imediatamente se surpreendeu. Aquilo era verdadeiramente incomum. Ele pensava em se drogar o tempo todo, de fato se drogava quase todos os dias. E de repente passou 3 dias com pensamentos em outros lugares, mas não nas drogas.

De lá pra cá a ibogaína se tornou um fenômeno underground nos círculos de abuso de drogas. Mas não porque as pessoas queiram usar ibogaína pra ter viagens loucas, como fez Lotsof, e sim porque as pessoas estão buscando, algumas desesperadamente, se livrar daquilo que a psiquiatria chama de dependência química: o uso abusivo, descontrolado, repetitivo e despropositado de drogas. Hoje estima-se que, no mundo, existem algumas centenas de milhares de usuários de drogas. E uma pequena parcela destes usuários, entre 10 e 20%, são considerados pela psiquiatria como dependentes químicos. Pra estas pessoas, que ficam dependentes, há muitas alternativas de tratamento, tanto no Brasil quanto no exterior. Igrejas, Alcoólicos Anônimos (AA), grupos de ajuda mútua, comunidades terapêuticas e diversas formas de psicoterapia. O problema é que a maioria destas opções, pra maioria dos pacientes, não funciona. Nos melhores casos, cerca de 30% dos participantes de determinado tratamento param de usar drogas. E frequentemente os casos de sucessos ficam abaixo dos 10%.

Outro fator que chama atenção é a quase absoluta falta de tratamentos farmacológicos para a dependência química. Se a medicina se desenvolveu rápida e bruscamente tendo como uma de suas principais ferramentas a farmacologia – comprimidos, pílulas, xaropes e até mesmo injeções – o tratamento da dependência química ficou pra trás. No caso dos opióides, bastante utilizados na América do Norte, há algumas opções de substituição, como por exemplo a metadona, que é oferecida como opção para usuários de heroína e morfina. Mas a metadona também vicia e causa vários problemas de saúde, e é bastante discutível se é um tratamento de fato, ou apenas a troca de uma droga ilegal por uma legalizada. Já no caso das bebidas alcoólicas, cigarro, cocaína e crack, bastante utilizados no Brasil, praticamente não há intervenção farmacológica disponível. Quando as pessoas estão passando pela famosa e difícil fase das fissuras – vontades quase que incontroláveis de usar droga novamente – é comum o uso de fármacos calmantes, os ansiolíticos, ou benzodiazepínicos. Mas isso não é exatamente um tratamento farmacológico para a dependência química propriamente dita, e sim um auxílio para a grande ansiedade que os pacientes sentem nesta fase.

"Temos então um problema recorrente em nossa sociedade, de pessoas que abusam de drogas, alguns se viciam, e não temos remédios para ajudá-los a sair desse estilo de vida prejudicial e danoso. E é então como alternativa para ajudar estas pessoas que a ibogaína se destaca. Hoje foi publicado pelo Journal of Psychopharmacology, revista científica especializada em pesquisas variadas sobre substâncias psicoativas, o resultado de nossa pesquisa com ibogaína, conduzida nos últimos 3 anos. De maneira resumida, o que encontramos após entrevistar 75 pacientes dependentes foi que, após participarem no tratamento com ibogaína, 72% foram encontrados abstinentes. Esta taxa de sucesso inclui alguns pacientes que estavam abstinentes, mas com ajuda de outros tratamentos que foram buscar após o tratamento com ibogaína. Mesmo se descontarmos estes da taxa de sucesso, ficamos ainda com 61% dos pacientes se declarando totalmente abstinentes. Isto é ainda mais impressionante quando consideramos que vários destes pacientes já tinham feito outros tratamentos antes, de que começaram a usar drogas muito cedo, antes dos 15 anos (alguns começaram a beber álcool antes dos10) mas não conseguiam parar. E o tempo que ficaram abstinentes é igualmente impressionante: cerca de 5 meses pra quem tomou ibogaínba apenas uma vez e de mais de 8 meses pra quem tomou ibogaína mais de uma vez, sempre no hospital, acompanhado pelo médico responsável.

Mas nem tudo em tratamento de dependência se mede apenas com abstinência. Muitos haviam se divorciado, perdido emprego, abandonado a faculdade e se distanciado dos filhos. Alguns retomaram os estudos, outros voltaram a cuidar dos filhos e teve paciente inclusive que voltou a viver com a ex-mulher. Tudo isso nos indica que de fato a ibogaína tem um potencial extraordinário em ajudar abusadores de drogas a mudarem seu estilo de vida e a se reintegrarem na sociedade, redefinirem suas prioridades e objetivos de vida. Mas fica a questão: como a ibogaína ajuda estas pessoas a largarem um vício que tantos outros tratamentos fracassam? Pra entender melhor o que acontece, precisamos olhar além dos números e escutar estes pacientes, suas histórias, sua experiências psicodélicas com esta poderosa molécula. A jornada interior com a ibogaína é longa, profunda e muitas vezes bem dolorosa, até mesmo apavorante. Mas o resultado pode ser extremamente libertador, caso o paciente esteja disposto a enfrentar seus problemas, dores e traumas. E é aí que a atitude da equipe médica e psicológica pode fazer muita diferença. Vejam os resultados parciais acompanhados no vídeo abaixo.


É importante também garantir a segurança de quem toma ibogaína. Em nosso estudo não encontramos nenhum caso de efeitos adversos graves, como surtos psicóticos, e também não houveram fatalidades. Isto é importantíssimo pois há relatos na literatura científica de casos em que o uso de ibogaína resultou em morte. Entretanto, sequer sabemos se nestes casos a substância ingerida foi de fato a ibogaína ou algum extrato contendo outras coisas, ou sequer contendo ibogaína. E também não sabemos a dose. Isto acontece pois em países como os EUA a ibogaína é proibida, simplesmente por ser considerada uma substância psicodélica. E isto leva os tratamentos a serem feitos em condições inadequadas, o que muito provavelmente está relacionado as fatalidades que ocorreram. Mas em uma condição jurídica favorável, como é atualmente no Brasil, verificamos que o tratamento médico feito com ibogaína farmacêutica de pureza bem estabelecida e dose conhecida, em ambiente hospitalar com acompanhamento médico e psicológico, não resultou em qualquer fatalidade ou evento adverso.

Concluímos portanto que sim, a ibogaína possui um potencial extraordinário para ajudar a “cuidar de” pacientes com uso problemático de psicoativos diversos. Sendo este cuidado feito dentro de ambiente terapêutico com acompanhamento médico, substância de procedência conhecida, dose precisamente estabelecida e apoio psicológico para atravessar a profunda jornada interior eliciada por esta substância, podemos estar testemunhando o nascimento de um novo e fascinante tratamento dentro da medicina psicodélica. Mas pra chegar lá, precisamos ainda aprofundar os estudos de segurança e eficácia, o que já estamos elaborando para o futuro próximo das pesquisas do Plantando Consciência."

Temos também outro produto da natureza, usado para abrir a Janela da Alma. A "Jurema Negra" ( Mimosa Tenuiflora ). Também conhecida como Espinheiro Preto. É uma árvore muito conhecida no nordeste brasileiro~. São utilizadas a casca e a raiz macerada na água, vinho ou cachaça. É desta planta que se origina o famoso "Vinho da Jurema", citado até na obra "Iracema", de José de Alencar - "Através da planta, os guerreiros de Arakem entravam em comunicação com o mundo invisível"

É usada nos rituais do Catimbó e pajelanças, principalmente entre os índios Jês e Tapuias e Kariris. O preparo da bebida e o cerimonial eram secretos. Era usada por médicos-feiticeiros, juntamente com o fumo e o maracá, para abençoar, aconselhar e curar. A ingestão permite ao pajé entrar em contato com seus espíritos ancestrais.Na Umbanda, Jurema é a dona das ervas mágicas.


Vemos assim, que a Janela da Alma sendo aberta, os indivíduos têm uma grande chance de curar-se de efeitos psicológicos que os levaram às drogas e também pelo uso ritualístico das substância encontradas na natureza, usadas de forma criteriosa, como é feito na medicina e nas religiões que as usam, encontrarem-se consigo mesmo e revisarem suas próprias almas para viverem em paz consigo próprio e com seu próximo.

Documentário sobre o Daime



Fontes da pesquisa: Revista Superinteressante - wikipedia - Youtube - plantando consciencia.org - Visita à Igreja Flor da Rainha - Santo Daime - Aracaju-SE.