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quinta-feira, 22 de setembro de 2016

LAMPIÃO - SANGUE EM BELMONTE (Em 3 versões)

As versões dos acontecimentos variam de uma forma contundente na história de Lampião e seus inimigos. Para um leitor desatento, que não registre em sua memória o que leu em diversos livros sobre os episódios vividos por aqueles da época e narrados pelos escritores, por certo ao conversar sobre os assuntos, em algum momento, poderá ouvir outra versão do acontecido. Temos disparidades e citarei aqui apenas três ou quatro livros, de autores que merecem todo o nosso respeito, e que colheram informações de fontes diferentes.

Em O Canto do Acauã, na página 157 da sua segunda edição, revista e ampliada, temos a narrativa do histórico episódio sobre Ioiô Maroto e a morte do coronel Gonzaga, narrada por sua autora, Marilourdes Ferraz, que nos conta: "... Apenas quatro meses depois do grande assalto à Água Branca o olho de lince de Virgulino mirou a riqueza de Luís Gonzaga Lopes Gomes Ferraz, residente em São José do Belmonte. Esse senhor gozava do apreço e admiração das pessoas da terra por sua capacidade de trabalho e probidade. Igual à imensa maioria dos sertanejos, teve um difícil começo na vida; foi almocreve e iniciou suas atividades comerciais junto a seu pai, Cândido, e ao seu irmão, João, ainda na vila de São Francisco. 

Quando ali não foi mais possível permanecer, os comerciantes partiram e entre eles estavam Gonzaga e Francisco Pita, mais conhecido por Chico Pita. Este, transformar-se-ia em industrial no agreste pernambucano, mas Gonzaga não foi tão longe, ficando ali mesmo no sertão, em São José do Belmonte, onde seria atingido pela violência na segunda quinzena de outubro de 1922. 

Ampliando suas atividades comerciais, Gonzaga conseguiu reunir bens consideráveis depois de longos anos de extenuante trabalho, movido pelo desejo de assegurar o futuro de sua família. Além de comerciante, era também fazendeiro, industrial, proprietário de uma usina de beneficiamento de algodão e de armazéns. Efetuava transações com couro de caprinos e com algodão, prestava assistência aos agricultores da região através de pequenos financiamentos e não se recusava a auxiliar parentes e amigos. Foi ele que ofereceu uma boa quantia como ajuda financeira para a construção da igrejinha de Nazaré. 

Gonzaga há muito tempo vinha atendendo às exigências dos cangaceiros, fornecendo-lhes dinheiro, tecidos e objetos, para ser deixado em paz, até que sobreveio o incidente que o levou a cair no desagrado dos bandoleiros. Estava ausente de casa quando chegou um mensageiro com uma relação de pedidos a serem atendidos; sua esposa, indignada, negou-se a atender às exageradas solicitações, com um comentário final que o irritou: "Que fossem trabalhar como meu marido sempre o fizera". 

Antes mesmo desse episódio, ainda em maio daquele fatídico ano de 1922, parte do grupo de Sebastião Pereira, incluído Lampião, interceptou na estrada um comboio de tecidos para Gonzaga, proveniente de Arcoverde; a mercadoria foi arrebatada e fartamente distribuída entre os componentes do bando e moradores das proximidades a fim de silencia-los enquanto outra parte foi queimada. O comerciante sofreu com isso enormes prejuízos; depois disso, temendo outros assaltos e como medida de precaução, reuniu um grupo de homens armados para a sua segurança. Foi então que ocorreu outro fato desagradável.

O tenente Montenegro, comandante de uma força volante do Ceará que estava no encalço de Sebastião Pereira em terras pernambucanas, recebeu uma carta falsamente escrita em nome de Gonzaga,(vejam a segunda versão*) na qual se denunciava Crispim Pereira, mais conhecido por "Yoyô Maroto", como colaborador dos cangaceiros. Esse oficial, sem pistas ou sem informações sobre o grupo, foi levado a acreditar na carta-denúncia e antes de regressar ao Ceará passou pela casa de "Yoyô", procedendo a uma rigorosa arguição que levou "Maroto" a passar por sério vexame. 

Inconformado com o acontecido, Gonzaga logo entrou em contato com "Maroto" para explicar-lhe a sua inculpabilidade no caso. Este simulou acreditar na inocência de Gonzaga, tanto que dias depois lhe tomou emprestada uma máquina de descaroçar algodão. Foi nesse tempo que o comerciante resolveu dispensar o pessoal armado que se encontrava à sua disposição encarando com incredulidade um boato que então corria sobre um suposto ataque contra ele, promovido por seu compadre "Yoyô Maroto" juntamente com Lampião. 

E o ataque aconteceu realmente. No dia 20 de outubro, às cinco horas da manhã, a residência de Gonzaga estava cercada por numeroso grupo de cangaceiros liderados por Lampião e "Yoyô Maroto". Gonzaga pelejou com todo empenho ouvindo os golpes de machados contra as portas, que foram arrebentadas. Quando os facínoras conseguiram entrar, Gonzaga refugiou-se no sótão, mas uma tábua do assoalho cedeu e ele caiu no meio da horda, que o liquidou friamente. Seguiu-se o saque, estendido a um armazém vizinho pertencente a Gonzaga; as mulheres da casa foram violentamente despojadas de suas jóias. 

Foi então que o cangaceiro Zé Terto, apelidado de "Cajueiro", vendo aquela situação constrangedora para as mulheres, reuniu-as num compartimento e postou-se à entrada em guarda, não permitindo que os companheiros tentassem outras violências. Aliás, era esse o comportamento habitual de "Cajueiro" durante os assaltos, proteger as mulheres contra ataques sexuais; dizia relacionar essa atitude com seus próprios sentimentos de respeito à sua mãe. 

Os cangaceiros aquartelados na casa invadida respondiam agora ao tiroteio do bravo sargento José Alencar de Carvalho, que mesmo enfermo estava à frente de seu pequeno destacamento composto por oito soldados, tentando impedir que o assalto se estendesse a outras casas e estabelecimentos comerciais. Também extraordinária foi a atuação do parente e vizinho de Gonzaga, Manuel Gomes de Sá; juntamente com os filhos, João e Antônio, também sustentou a resistência, disparando contra os cangaceiros desde o início. O bando não conseguiu suportar por muito tempo o tiroteio cerrado do famoso sargento Alencar e bateu em retirada; deixava três mortos (Antônio "da Cocheira", "Baliza¹" e "Berdo") e seis feridos (entre os quais "Yoyô Maroto" e Cícero Costa). 

A facção contrária perdeu, além de Gonzaga, o soldado Heleno; houve um ferido, João Gomes de Sá. O trauma provocado pelo trágico desaparecimento de Gonzaga levou sua esposa, Martina, a retirar-se do sertão com sua família, fixando residência no Sudeste do país. Com ela seguiu a família de seu cunhado, João Lopes Gomes Ferraz. Gonzaga, que foi também prefeito de São José do Belmonte, deixou os seguintes filhos: José, médico na Marinha Mercante (falecido); Napoleão, químico (falecido); Laércio, funcionário do Banco do Brasil; Ramiro e Otacílio, dentistas; e as filhas Nair, Diva, Maria de Lourdes e Edy (as duas últimas falecidas)."

¹ - Segundo Baliza (Dic. Biográfico Cangaceiros e Jagunços pg 66 - Renato Luís Bandeira

* A segunda versão:  

Já no livro de José Bezerra Lima Irmão, Lampião a Raposa das Caatingas, a tratativa entre Gonzaga e o tenente Montenegro deu-se não por causa de carta anônima, e sim por um conchavo, pois a política afasta até mesmo irmãos, quanto mais compadres. 

Nos tópicos "Lampião faz justiça à sua maneira" na pg 122 sobre o "Desagravo a loiô Maroto e a morte do coronel Gonzaga, o autor cita sua fonte no escritor Billy Jaynes Chandler em seu livro Lampião o rei dos cangaceiros.**

Desagravo a Ioiô Maroto a morte do coronel Gonzaga 

"Dando seguimento ao seu projeto de vingança, o próximo passo de Lampião foi o cumprimento da promessa feita a Sinhô Pereira, com relação aos maus-tratos infligidos à família de Crispim Pereira de Araújo, conhecido como Ioiô Maroto. O episódio era ainda resquício das desavenças históricas entre as famílias Pereira e Carvalho. Ioiô Maroto, fazendeiro em Belmonte, Pernambuco, parente de Sinhô Pereira, havia tido um problema com o coronel Luís Gonzaga Gomes Ferraz (coronel Gonzaga), prefeito (intendente) daquela cidade, ligado à família Carvalho, porque, apesar de serem compadres e amigos, Ioiô votara contra sua chapa na eleição para prefeito. 

Aborrecido com o fato, Luís Gonzaga aproveitou o ensejo da passagem de uma força policial do Estado do Ceará que tinha andado por Pernambuco à procura de jagunços de Zé Inácio do Barro e fez um conchavo com o comandante, o tenente Peregrino Montenegro, para que a volante fosse à fazenda São Cristóvão, de Ioiô Maroto, e desse uma surra nele. Os soldados fizeram mais que isso: saquearam a casa, maltrataram o fazendeiro e fizeram propostas obscenas às mulheres da família. Ioiô, profundamente desgostoso, sentindo-se desmoralizado, deixou de ir à cidade, não tirava a barba nem cortava o cabelo. 

Lampião procurou Ioiô Maroto e disse ao que vinha. Maroto ponderou que não queria vingança, entregava tudo a Deus. Lampião insistiu: — Eu prumiti a Sinhô Perera que risurvia esse negoço, e vou risorvê. Vá tirá essa barba e corta esse cabelo, seu Maroto! Quero qui o sinhô vá cumigo, pra vê a coisa! Vão se arrependê do dia qui pensaro qui o sinhô nun era home! 

O coronel Luís Gonzaga, também conhecido como Major Gonzaga, além de fazendeiro era também comerciante, dono do maior armazém da cidade, vizinho da sua residência, na praça da igreja. Lampião entrou em Belmonte com uns 70 cangaceiros na madrugada de 20 de outubro de 1922. Levava em sua companhia o jovem Tiburtino Inácio de Sousa, vulgo Gavião, filho de Zé Inácio do Barro, amigo de todas as horas de Sinhô Pereira. Chovia muito. Gonzaga e os vizinhos acordaram com uns estrondos, que a princípio pensaram ser trovões — eram os cangaceiros derrubando o portão do muro e em seguida a porta da cozinha a golpes de machado. 

Um vizinho foi correndo avisar ao sargento José Alencar de Carvalho Pires, conhecido como Sinhozinho Alencar, tido como sujeito valente, dotado de uma pontaria invejável. Embora na cidade só houvesse 7 soldados, alguns moradores se juntaram à polícia e logo começaram a atirar dos telhados e janelas das casas próximas. Os primeiros a entrar na casa foram Livino e Cajueiro. Na sala de jantar, toparam com dona Martina, mulher de Luís Gonzaga. — Cadê o Majó Gonzaga? — perguntou Livino. — Tá aí... — respondeu a mulher, assustada. Os cangaceiros espalharam-se pela casa, vasculhando cada cômodo — casarão enorme, com um corredor central, quartos de um lado e do outro. 

Livino entrou no quarto do casal, olhou atrás da porta, debaixo da cama, escancarou os armários. Nada do homem. Ao ouvir um ruído no sótão, Livino subiu a escada, forçou a porta e meteu a cabeça para espiar lá dentro. Mas o sótão era muito escuro. Gonzaga, de pijama, com uma pistola Browning na mão, recuou para o fundo do compartimento. Por azar, uma tábua do assoalho arrebentou e ele estatelou-se no chão, na sala da frente. Com uma perna quebrada, ele entrou num quarto e tentou saltar a janela, mas foi agarrado e arrastado de volta à sala. 

Ioiô Maroto aproximou-se manejando o rifle cruzeta. Gonzaga arregalou os olhos, levantou os braços, as mãos espalmadas e trementes, suplicando clemência. Ioiô deu-lhe três tiros — dois no coração e um no meio da testa. Lampião abaixou-se, tirou a aliança do coronel e enfiou nela o próprio dedo médio. Contemplou a valiosa joia e calculou: — Esta vale pelo meno um conto de réis... Jogou em cima do corpo roupas e lençóis, e tocou fogo. Dona Martina despejou um balde de água sobre o corpo, debelando as chamas, de modo que o morto ficou apenas chamuscado. 

Um cangaceiro chamado Vereda ia arrastando Abgail (Biga), filha de Gonzaga, para um quarto, mas foi impedido por Cajueiro: — Você nun vai fazê isso, Vereda, só se me matá premero. Quais foi as orde qui nóis recebeu? Depois disso, dona Martina e a filha foram postas na despensa, e o cangaceiro Fiapo foi encarregado de protegê-las até o momento da retirada."

** A terceira versão: 

Trago agora para os amigos, a obra apontada pelo autor do livro Lampião: Raposa das Caatingas, como referência, essa é terceira versão que comento. Billy Jaynes Chandler em seu livro Lampião o rei dos cangaceiros, na referência que faz ao assassinato de Luis Gonzaga, diz que não se sabe ao certo se Maroto pediu a Lampião para - se vingar, ou se Lampião, ao ouvir o que tinha acontecido a seu amigo acorreu e induziu-o a agir, pois contam as duas histórias. Uma versão conta que Sebastião Pereira, antes de deixar o cangaço, pediu a Lampião, na despedida, para matar Gonzaga. 

"Lampião... Uns dois meses depois, matou, de novo, por vingança, desta vez em Pernambuco. Foi um dos crimes mais famosos do princípio de carreira, pois a vítima foi um chefe político muito conhecido, Coronel Luís Gonzaga de Souza Ferraz.*¹º 

Gonzaga, que morava na cidade Belmonte, em Pernambuco, perto da fronteira com Ceará, não era inimigo pessoal de Lampião, mas este ajudou a matá-lo, por causa do amigo, Ioiô Maroto. 

Maroto era parente de Sebastião Pereira, que um dos companheiros de Lampião no cangaço, enquanto que Gonzaga pertencia à família dos Carvalho, inimigos tradicionais de Pereira. Durante anos, Gonzaga viveu armando intrigas contra os Pereira, também morou em São Francisco, a cidade natal de Sebastião Pereira. Mas o que realmente provocou o assassinato, foram os maus tratos que Maroto sofreu nas mãos de uma força da polícia do Ceará, que tinha vindo para Pernambuco, para caça aos bandidos. Em Belmonte, o comandante fez amizade com Gonzaga. No caminho de volta ao Ceará, os soldados passaram por São Cristóvão, a fazenda de Maroto e o maltrataram, bem como à sua família. Além de saquear a casa e dependências, eles insultaram Maroto e fizeram propostas obscenas às mulheres da família. Maroto pôs a responsabilidade da afronta a Gonzaga." 

E continua Billy Jaynes: 
"Não se sabe ao certo se Maroto pediu a Lampião para - se vingar, ou se Lampião, ao ouvir o que tinha acontecido a seu amigo acorreu e induziu-o a agir, pois contam as duas histórias. Uma versão conta que Sebastião Pereira, antes de deixar o cangaço, pediu a Lampião, na despedida, para matar Gonzaga.  

De qualquer modo, Lampião e Maroto, à frente de setenta homens, chegaram a Belmonte, uma pitoresca cidadezinha situada num planalto, numa região de serras, na madrugada do dia 20 de outubro. Ao entrarem na cidade ainda adormecida, pensaram que não precisavam se preocupar, pois haviam só sete soldados no destacamento da polícia. O bando então se encaminhou para a casa de Gonzaga, situada na praça principal. A futura vítima era um fazendeiro abastado, e homem de negócios, e seu armazém, o maior da cidade, ficava pegado à casa. 

É evidente que o assalto foi por vingança, mas uma vingança que trazia lucro. Ao tentarem entrar na casa, os cangaceiros foram recebidos à bala. Isto serviu para alertar a polícia e outras pessoas na cidade. Seguiu-se, então, um tiroteio que durou umas quatro a cinco horas. Quando terminou, Gonzaga estava morto e seu armazém tinha sido saqueado. Maroto estava vingado. Terminado o trabalho, o bando teve que abrir seu caminho à bala, porém, com vítimas: quatro ou cinco cangaceiros morreram. 

Maroto nunca pagou pelo crime. Na confusão que se seguiu, a polícia não estava em condições de processá-lo, e portanto, ele continuou a viver em paz, e bem protegido, na sua fazenda, a uns dez quilômetros da cidade. Quando as condições melhoraram e finalmente foi aberto um processo contra ele, deixou a região e se refugiou na casa dos Feitosa, em Inhamuns, Ceará. Os Feitosa tinham adquirido a fama de dar proteção aos fugitivos da lei, de mais prestígio. 

Alguns anos antes, mais ou menos em 1905, os Feitosa tinham também dado proteção a vários membros da família de Antônio Silvino, quando estavam sendo perseguidos pela polícia de Pernambuco. Seus descendentes, assim como os de Maroto, ainda vivem em Inhamuns. Os descendentes de Maroto se misturaram com os Feitosa."

* 10 - A narração da morte de Gonzaga se baseia principalmente numa entrevista com João Primo de Carvalho, Belmonte, 30 de julho de 1975. O Diário de Pernambuco deu uma pequena nota, no dia 21 de outubro de 1922. Ver também Wilson: Vila Bella P 338-340. 

Vemos assim três versões mais ou menos iguais, se complementando em informações, mas com alguns conflitos. Nessa avaliação não me arvoro em opinar o que está certo ou errado, pois sei que até mesmo grandes historiadores e pesquisadores, colhem suas investigações na procura da verdade, buscando-as nas indagações a pessoas que viveram à época ou que ouviram a história de quem esteve presente, também averiguando jornais, revistas, e livros, explorando e indagando. E que a mente humana é falha em guardar os acontecimentos ao longo dos anos que se passaram. 

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

ANUNNAKI - Mensageiros do Vento

Esse musical baseado no LIVRO DE ENKI que estou colocando em formato digital falado, na sequencia dessas nove partes postadas no Youtube tem uma excelente mensagem, tanto gráfica, quanto na letra e musica. (SE NÃO TIVER PACIÊNCIA PARA LER O TEXTO, PASSE PARA BAIXO E ASSISTA AS PRIMEIRAS 8 PARTES DO MUSICAL)

Para aqueles que já leram esse livro O Livro Perdido de Enki se torna mais fácil a compreensão da mensagem que estão registradas na "tabuinhas de argila" escritas pelos Sumérios.

Enki é o filho primogênito de Anu com uma concubina chamada Ninul e tinha por esposa oficial a sua meia irmã Damkina que depois foi nomeada Ninki que significa ("Senhora da Terra") filha de Alalu onde este se tornou pai de Enki por matrimônio. Ninki teve filhos com Enki, dos quais se destacam Marduk (deus babilônico cultuado pelo rei Nabucodonosor), Ningishzidda e Nabu (o Nebo bíblico, e também teve filhas com outra meia irmã chamada Ninmah).


A descendência genealógica de Enki narrada em tábuas de argila pelas antigas civilizações começa a se tornar desconhecida após a queda do antigo império babilônico e o desaparecimento da civilização suméria; existem paralelos em outras culturas e povos que surgiram posteriormente e que possívelmente continuaram a relatar os acontecimentos com Enki, renomeando o antigo deus da Suméria. O deus egípcio Ptah é um grande exemplo deste paralelo, não somente na semelhança da doutrina como também na cronologia dos fatos e todos os registros arqueológicos, portanto não se pode descartar a possibilidade de haver uma genealogia em toda a cultura do Egito que esteja se referindo ao antigo deus sumério Enki como Ptah. Outro paralelo pode-se traçar com o Deus Netuno dos romanos, conhecido por Poseidon pelos gregos.

O nome Enki significa "Senhor da Terra" (En significa "Senhor" e Ki significa "Terra", em uma referência ao planeta Terra).


Os seus símbolos iconográficos são o peixe, o carneiro e a serpente, o mítico Capricórnio (o qual se tornou um dos doze signos do zodíaco e cuja ideologia teve a sua base na civilização suméria).

EA é um príncipe destinado ao trono, mas é enviado a Ki para salvar seu povo que sofria em uma grande calamidade que se agravava com o tempo, com Anzu e um grupo de 50 heróis, Ea se aventura em uma carruagem celestial entre os deuses celestes atravessando o Bracelete Esculpido um de seus maiores desafios em sua missão, EA é nomeado Enki após sua chegada a Ki e inicia a elaboração de planos para extrair pedras e minerais das águas, com exclusividade do ouro, uma tábua de argila suméria descreve as palavras de Enki ao chegar a Ki:

"Quando eu me aproximei vi verdes pradarias. Ao meu comando foi dada a ordem para provar se havia água potável. Ao meu comando foi dada a ordem para provar se havia alimento apropriado. Ao meu comando foi dada a ordem para provar se os gases eram respiráveis."

Enki, após trabalhar duro na construção de Eridu que em sumério significa "lar distante", passou a descansar no sétimo dia, um claro paralelo encontrado na bíblia, onde o sétimo dia de descanso do grupo de 50 heróis também deveria ser um dia de festejo e recordação de seus feitos em Ki.


Sem sucesso em sua empreitada e com uma calamidade se agravando para o povo, Anu envia Enlil, meio irmão de Enki, para Ki para inspecionar todo o trabalho e se tornar governante e comandante de Ki e é a partir deste período que começam as discussões que posteriormente se tornariam terríveis guerras.

Dominou a fúria do Bracelete Esculpido e chegou em Ki, fundou Eridu e em conjunto com sua meia irmã Ninmah e seu filho Ningishzidda participou do momento da criação do homem usando do seu próprio sangue na concepção. Após um sonho em que um mensageiro chamado Galzu lhe anuncia o dilúvio e lhe mostra o projeto de uma arca, Enki teve um filho chamado Ziuzudra ao qual escolheu para se salvar do dilúvio, lhe indicou que construísse uma grande arca e que levasse consigo a semente da vida de tudo o que existia; Ziusudra é facilmente reconhecido no bíblico Noé - Genesis Capítulo 6.

Um dos símbolos de Enki também era a serpente devido a sua participação na criação de Adamu entrelaçando as duas essências, dos Deuses e do homens, por este motivo existe há quem defenda que este deus seria também a serpente do Éden que entrega o conhecimento a sua querida criatura, indo contra as de seu irmão Enlil, que queria os manter como escravos, o que o leva ao julgamentos dos deuses e de seu pai Anu, que favorece Enlil. Desde então Enki sofre campanhas de demonização como se fosse o verdadeiro inimigo dos humanos. Nesse período também nasce Adapa. Segundo os sumérios é a partir de Adapa e não de Adamu que nasce K-in e Aba-el que eram irmãos gêmeos o (Caim e Abel na bíblia).

Enki era o deus do conhecimento e sabedoria, que portava os segredos da vida. e da morte. E que gerou o homem através do cruzamento de duas essências, divina e terrestre.
O símbolo da serpente com a forma em espiral lembra a representação do DNA humano.

O símbolo da serpente é utilizado pela medicina até os dias de hoje.

Fonte: Wikipedia


A escrita cuneiforme 

A escrita suméria, grafada em cuneiforme, é a mais antiga língua humana escrita conhecida. A sua invenção deve-se às necessidades de administração (cobrança de impostos, registo de cabeças de gado, medidas de cereal, etc.) Escrita cuneiforme é a designação geral dada a certos tipos de escrita feitas com auxílio de glifos em formato de cunha. É, juntamente com os hieróglifos egípcios, o mais antigo tipo de escrita, tendo sido criado pelos Sumérios na antiga Mesopotâmia por volta de 3500 AC

Inicialmente a escrita compunha-se de marcas simples, depois depictogramas, depois as formas tornaram-se mais simples e abstractas. Os primeiros documentos eram gravados em tabuletas de argila, em sequências verticais de escrita, e com um estilete feito de cana que gravava traços verticais, horizontais e oblíquos. Em breve, tornou-se comum o uso de linhas. (grid system!)


Duas novidades tornaram o processo mais rápido e mais fácil: os escribas começaram a escrever em sequências horizontais (rodando os pictogramas no processo), e um novo estilete em cunha inclinada passou a ser usado para empurrar o barro, enquanto produzia sinais em forma de cunha. Ajustando a posição relativa da tabuleta ao estilete, o escriba poderia usar uma única ferramenta para fazer uma grande variedade de signos.


As tabuletas cuneiformes podiam ser cozidas em fornos para prover um registro permanente. Muitas das tabuletas achadas por arqueólogos foram preservadas porque foram «cozidas» durante os ataques incendiários de exércitos inimigos, contra os edifícios no qual as tabuletas eram mantidas.


Inventada pelo sumérios para registrar a língua suméria, a escrita cuneiforme foi adoptada pelos Acadianos, Babilónicos, Elamitas, Hititas e Assírios — e adaptada para escrever em seus próprios idiomas; foi extensamente usada na Mesopotâmia durante aproximadamente 3 mil anos, apesar da natureza silábica do manuscrito (como foi estabelecido pelo Sumérios) não ser intuitiva aos falantes de idiomas semíticos.


A língua suméria é uma língua isolada, que não está diretamente relacionada a nenhuma outra língua conhecida, apesar das várias tentativas equivocadas de provar ligações com outros idiomas. A língua suméria é aglutinante, ou seja, os morfemas (as menores unidades com sentido da língua) se justapõem para formar palavras.

Os sumérios inventaram o sistema cuneiforme de escrita, que foi utilizada em toda a Mesopotâmia e por povos vizinhos. Os Acádios, após conquistarem a Suméria, adoptaram o sistema cuneiforme para materializar a própria língua.

A escrita cuneiforme começou como um sistema pictográfico, onde o objecto representado expressava uma idéia. Um barco marcado por determinados sinais, por exemplo, poderia significar que ele estava carregado ou vazio.

Com o tempo, os glifos cuneiformes passaram a ser escritos em tábuas de argila, nos quais os símbolos sumérios eram desenhados com um caniço afiado chamado estilete. As impressões deixadas pelo estilete tinham forma de cunha, razão pela qual sua escrita é designada cuneiforme.

Um corpo extremamente vasto (muitas centenas de milhares) de textos na língua suméria sobreviveu, sendo que a maioria está gravada nas tabuinhas de argila.

Os textos sumérios conhecidos incluem cartas pessoais e de negócios e/ou transações comerciais, receitas, vocabulários, registos de leis, hinos e rezas, encantamentos de magia e textos sobre Matemática, Astronomia e Medicina. Inscrições monumentais e textos sobre diversos objectos, como estátuas ou tijolos, também são bastante comuns.

Muitos textos sobrevivem em múltiplas cópias pelo facto de terem sido transcritos repetidamente por escribas "estagiários".

A escola de Edubba (termo sumério que significa "Casa de Tabuinhas"), por exemplo, era um dos centros de aprendizagem onde arquivos e escritos literários eram guardados (ou seja, grafados) em tabuinhas de argila. Edubba foi um dos primeiros centros acadêmicos e um dos primeiros receptáculos de sabedoria de que se tem conhecimento.

A compreensão dos textos sumérios hoje em dia pode ser problemática até mesmo para especialistas. Os textos mais antigos são os mais difíceis, pois não mostram a estrutura gramatical da língua de forma sólida.

Links
The Electronic Text Corpus of Sumerian Literature (ETCSL), a project of the University of Oxford etcsl.orinst.ox.ac.uk/

DIGITAL LIBRARY FOR CUNEIFORM cdli.ucla.edu

Ancient Scripts Sumerian


Sumerian Language Page www.sumerian.org/sumerian.htm




PARTE 1
ENUMA ELISH: O PRINCÍPIO CELESTIAL


PARTE 2
ABDUÇÃO DE ENDUBSAR



PARTE 3
CRÔNICAS DE NIBIRU



PARTE 4
NOTÍCIAS DE UM MUNDO DISTANTE


PARTE 5
ERIDU


PARTE 6
NOTÍCIAS DE UM MUNDO DISTANTE II


PARTE 7
AS MINAS DE ABZU


PARTE 8
O ROSTO EM MARTE


PARTE 9
ESTAÇÃO LAHMU



LIVRO EM FORMA FALADA

O Passado irá tornar-se o nosso futuro? A humanidade está destinada a repetir os eventos ocorridos em outro planeta, distante da Terra? Em suas obras, Zecharia Sitchin mostra o lado da humanidade da história - como registrado em antigas tabuletas de argila e outros artefatos sumérios - no que diz respeito às nossas origens nas mãos dos anunnakis, 'aqueles que vieram do Céu para a Terra'. Em 'O Livro Perdido de Enki', podemos observar essa saga de uma perspectiva diferente, por meio deste valioso relato autobiográfico concebido pelo Senhor Enki, um deus anunnaki, que conta a história da chegada desses extraterrestres à Terra, vindos do 12º planeta, chamado Nibiru.

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

A Real História do Cangaço Sendo Recuperada

Os poetas, escritores, cineastas profissionais ou amadores, exercendo atividades criativas e técnicas, podem tudo. Podem contar a história como foi e é, mas também podem viajar na ficção, deixando que suas mentes vagueiem na criação de situações que nunca ocorreram, ou enfeitarem a narrativa e o visual, com a percepção ficcional. 

Já os historiadores e pesquisadores, ao fornecerem material colhido, devem ser isentos e registrarem literalmente o que ocorreu, deixando tudo como aconteceu, fazendo apenas a narrativa que encontraram, sem envolvimento emocional de pender para quaisquer lado. Apenas a realidade do passado e presente interessa para tais.

Muitos livros trazem como objetivo principal trazer esclarecimentos considerados extremamente valiosos no que se refere à história. E na história do cangaço na época de Virgulino Ferreira da Silva, o célebre "Lampião", não pode ser diferente. Os historiadores e pesquisadores, de posse desse material, e que também se tornam escritores, devem mostrar o real papel de homens e mulheres envolvidos na saga, como bem o diz Manoel de Souza Ferraz, o Manoel Flor, um dos principais combatentes de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião; quando mostra que o cangaço "foi exaltado pela literatura popular sertaneja, mormente em sua forma mais difundida, a poesia. Nela, até os criminosos reconhecidamente empedernidos podiam ser glorificados nas ilusões do cancioneiro." - (1) ***

Trago aqui para os amigos, que não tiveram ainda a oportunidade de ler esse relato, desse bravo filho de Nazaré, que em seu depoimento referindo-se a essa veia poética que praticamente endeusava os criminosos, sabendo que o sertanejo tem uma grande simpatia por homens e mulheres valentes, chama-nos a atenção para a correção dessas narrativas desviadas da realidade. Vamos ao relato, retirado de suas memórias, pela professora, jornalista e escritora Marilourdes Ferraz em seu livro O Canto do Acauã - 2ª Edição:

Coronel Manoel de Souza Ferraz

"O trabalho aqui exposto revela a necessidade em trazer a público um depoimento que mude os conceitos, quase sempre distorcidos, impostos e disseminados sobre a era do cangaço no sertão do Nordeste. Esta urgência é justificada porque são poucos os sobreviventes que maior participação tiveram nos acontecimentos e os quais se ressentem da deturpação dos fatos que viveram e presenciaram. Nosso objetivo é o de expor um relato, autêntico e verídico, daquele tempo conturbado, centralizando-o na região do rio Pajeú, em Pernambuco. O termo cangaceiro descreve um personagem de determinadas características que atuou no Nordeste; o termo engloba tanto o bandoleiro que formasse um grupo armado como o fazendeiro que possuísse a mesma atividade ou o simples agregado que defendesse os interesses do patrão por meio das armas. Sua principal característica era a valentia; era relevante que fosse ousado e mesmo insensato nos seus feitos. Os aspectos de valentia e coragem pertencem à admiração popular nas diversas culturas e épocas; também o cangaço foi exaltado pela literatura popular sertaneja, mormente em sua forma mais difundida, a poesia.

Nela, até os criminosos reconhecidamente empedernidos podiam ser glorificados nas ilusões do cancioneiro. Nas porfias entre grupos rivais o povo tomava partido como atualmente nos esportes e os entusiastas comentavam os últimos combates e defendiam com ardor apaixonado a facção que lhes parecia mais simpática. No sertão, naqueles tempos de enorme carência de apoio à população, principalmente no setor educacional e na estrutura jurídica que coibisse os abusos de poder do homem para com o seu semelhante, a criminalidade proliferou. 

Os habitantes dependiam do próprio valor pessoal para manter a sua integridade física e moral, e o uso amplo da força em seu pleno sentido já era estimulado na luta pela sobrevivência com a Natureza agressiva em tempo de estiagem. O grupo etário mais vulnerável a esse conjunto do influências era exatamente a infância, seguindo-se-lhe a adolescência. Dependendo da intensidade dos diversos fatores e da orientação familiar poderia haver conseqüências desastrosas ou benéficas á vida dos moços. A estrutura básica para o fortalecimento do caráter e a formação da personalidade estava no lar, secundada pela orientação dos poucos mestres-escola e dos religiosos que assistiam a população. isso se tornou ainda mais notável na citada região do Pajeú, onde cresceram os irmãos Ferreira e os homens que os combateriam até o fim do ciclo. 

Os futuros grupos conflitantes, cangaceiros e policiais, receberam a mesma carga de influências culturais e do meio ambiente, frequentaram as mesmas escolas improvisadas ao ar livre e tiveram dificuldades como todos os sertanejos. Lampião conviveu e recebeu a mesma educação de muitos conterrâneos, mas com a vantagem de possuir sua família uma situação financeira bem melhor que a de inúmeros sertanejos. Assim, no estudo de sua adesão ao banditismo, é importante que haja uma análise dentro do contexto da época, da região e de sua conjuntura sócio-cultural. 

A personalidade agressiva e contraditória do famoso cangaceiro foi alimentada pelas variadas influências que também agiram sobre os seus contemporâneos. No decorrer dos anos a versão dos acontecimentos da época foi de tal modo deturpada, principalmente por motivos políticos e ideológicos, que se tornou comum atualmente uma profusão de mitos e inverdades, acarretando equívocas tentativas de explicar o personagem Virgulino Ferreira da Silva, em particular, e o contexto histórico-social que, indiretamente, representava. 

É difundida e alimentada a crença de que a Polícia executou nos sertões apenas o papel de verdugo em sua represália contra o banditismo; seus presumíveis atos de vandalismo teriam estimulado a proliferação de homens que, como Virgulino, se tornavam cangaceiros a fim de praticar justiça com as próprias mãos; por inexplicável ódio, o fazendeiro José Saturnino, pretextando o furto de um simples chocalho pelos jovens Ferreira, perseguiu-os com requintes de crueldade, forçando sua adesão ao mundo do crime como único caminho para a sua sobrevivência; que esses pacatos e ordeiros rapazes foram obrigados a lutas intermináveis contra as injustiças, lembrando Robin Hood a castigar os maus e ajudar os infortunados; e ainda que o povo sertanejo teria depositado enorme confiança naqueles "paladinos" da Justiça. 

Tais incorreções foram alimentadas por deficiências na coleta e interpretação dos dados históricos e também por deturpação nos depoimentos fornecidos a alguns escritores que, por exemplo, chegaram a basear seu trabalho exclusivamente em versões de ex-cangaceiros ou de pessoas não possuidoras do necessário conhecimento dos fatos ou que os procuraram alterar em conveniência própria devido a estarem comprometedoramente envolvidos nos episódios da época, em detrimento de uma realidade mais ampla. 

Entretanto, não nos arrogamos na posse absoluta da Verdade nem procuramos rotular os cangaceiros de apenas bandoleiros ou transformar os soldados sertanejos que os enfrentaram em heróis isentos de erros; eram todos seres humanos e, como tais, vulneráveis equívocos e às forças que movem os povos e determinam a marcha da História; todos participaram de uma batalha de múltiplas origens e conseqüências, não sendo totalmente vilões ou totalmente santos muitos dos visados por preconceitos. 

Podemos, no entanto, afirmar com segurança que Virgulino Ferreira da Silva não foi obrigado por perseguições a adotar uma vida de banditismo; ao contrário, foi combatido por ter-se transformado em temível bandoleiro. Seu pai teve o fim precipitado pela turbulenta vida dos três célebres filhos. Antes que fosse muito tarde, Lampião recebeu conselhos e advertências e, o mais importante, o exemplo de numerosos habitantes da região em que vivia; contudo, fustigou-os de tal forma que os obrigou a se transformar de pessoas reconhecidamente pacíficas em argui-inimigas do cangaço quando perderam a crença em sua sobrevivência sem os recursos da luta armada. 

Os irmãos Ferreira assaltavam indiscriminadamente e faziam conluios com pobres ou ricos para os mais diversos fins; os seus prisioneiros eram muitas vezes mortos com requintes de sadismo e a sua fúria não poupava idade ou sexo das vítimas; inúmeras famílias sofreram com a perda de seus haveres e entes queridos. Como Lampião conseguiu atravessar longos anos sem ser detido? Em conseqüência do secular abandono da região sertaneja, as autoridades governamentais não possuíam os meios adequados para encerrar em curto prazo tão calamitosa situação. 

A falta de estradas e meios de transporte, o reduzido número de policiais, o deslocamento de tropas de Estado para Estado, o alistamento de pessoas que não se adaptavam aos rigores da luta, foram algumas das dificuldades encontradas. Os sertanejos tiveram que, praticamente sós, iniciar e manter por longo período o combate a mais um dos flagelos que tão frequentemente os assolavam, enfrentando carência de abastecimento, munições e armamentos, às vezes comprados com seus soldos. 

As forças que combatiam o cangaço se compunham de unidades móveis denominadas "volantes", as quais realizaram verdadeira epopeia, anos a fio, em esgotantes travessias do sertão de vários Estados nordestinos. Entretanto, são hoje cada vez menos compreendidas em seu papel. Também a opinião popular, que exaltava os feitos de bravura da Polícia, do mesmo modo tendia a depreciá-la, fornecendo errôneas explicações da razão de ser da vida de bandoleiro de Lampião, como nos versos seguintes:

"Assim como sucedeu
Ao grande Antônio Silvino
Sucedeu da mesma forma
Com Lampião Virgulino
Que abraçou o cangaço
Forçado pelo Destino... 
Porque no ano de Vinte
Seu pai fora assassinado. . ." (2)

Certamente houve atos impensados por parte de policiais, mas não foram comuns e geralmente ocasionados pelas contingências da luta. A dureza da campanha e as condições em que se desenrolaram os combates podem explicar algumas dessas atitudes. Não se pode esquecer o indescritível desgaste físico provocado pelas marchas prolongadas e pelas emboscadas associadas à sede e à fome no semi-deserto sertanejo. 

A enorme dedicação dos soldados visava a que seus contemporâneos um dia usufruíssem da tranqüilidade desejada. Muitos moços perderam a vida, outros a saúde física e mental; os verdes anos da juventude foram irremediavelmente gastos na luta. Apesar de tudo o que se diz, as pessoas de bem tinham confiança na atuação dos policiais. Isso é o que não pode ser omitido. Os erros de poucos não podem turvar a atuação de valorosos combatentes. Os que viveram os dias difíceis daquela época não poderiam mais calar ante as injustiças cometidas pelos que tentaram enlamear o sacrifício dos bravos componentes das Forças Volantes."

Do depoimento de Manoel de Souza Ferraz (Manoel Flor) 

(1) O Canto do Acauã - Introdução

(2) Luiz da Camara Cascudo, cita essa ode para Virgulino Ferreira, pg 162 de Vaqueiros e Cantadores. onde o restante da exaltação diz:

Por que no ano de Vinte
seu Pai fora assassinado
da rua da Mata Grande,
duas léguas arredado.
Sendo a força de Polícia
Autora deste atentado ...

Lampeão desde esse dia
jurou vingar-se também,
dizendo: — foi inimigo,
mato, não pergunto a quem...
Só respeito neste mundo
Padre Cisso e mais ninguém! ...

*** Vejam o artigo Cangaceiro e Cordel onde avalio que "O povo sertanejo nunca admirou criminosos. Algumas pessoas são enganadas por aqueles que querem "branquear" a história de bandidos e querem confundir os incautos com a admiração que o sertanejo tinha e tem por homens valentes."


Os cangacêro ero assim...

Os cabra, num tava nem ai, 
Se morria ou se matavo... 
E a vida qui levavo, 
Era matá ô morrê.
Os cabra, num tava nem ai, 
Se morria ou se matavo... 
Os cangacêro ero assim... 

As cobra num pica, 
As bala num entra, 
As faca num corta, 
Por orde de meu padim, 
Qui sempre quis assim. 
Num corre de ninguém, 
Num corre de volante, 
Infrenta inté um trem... 


Nem inté da importante, 
Do sargento Zé Rufino, 
Qui Nois briga, se rindo...

Nas asa da imaginação,
Por riba dos cardero,
Vamu vuando no sertão,
Qui no mêiz de janero,
Pega fogo qui nem tição... 

E nas asas da avoante,
Nóis arriba pela ai,
Pruveitando o vento quente,
Qui sopra pela aqui...

domingo, 18 de setembro de 2016

OS HOLANDESES NO BRASIL

OS HOLANDESES
NO BRASIL
Os holandeses na Bahia
(1624-1625)

   A potência marítima que mais esforçadamente concorria com Portugal e Espanha na obra dos descobrimentos era a Holanda. Desde 1579, até meados do Século 17, os holandeses, afirmando a independência das Províncias Unidas [Países Baixos: Holanda, Bélgica e Principado de Luxemburgo], sustentaram uma guerra desesperada contra a política ambiciosa dos Felipes [Espanha]. Dispondo de grandes recursos navais, não se limitavam os batavos a resistir, na Europa, os ímpetos do inimigo: revidavam os golpes, perseguindo nos mares as embarcações que traziam a bandeira da Espanha [lembrar que, entre 1580 e 1640 Portugal estava sob domínio espanhol], e invadindo-lhes as colônias estabelecidas na América e na Ásia. Já vimos como Venner, associado a piratas ingleses, andara pelas costas do Brasil em 1595, pilhando e incendiando povoações indefesas, como o Recife, de onde saíram fartamente compensados da sua audácia.

    Tal era o terror que inspiravam esses salteadores dos mares, e tão desafrontados se mostravam no seu ofício que, naqueles tempos, mesmo comboiadas de navios de guerra, as embarcações mercantes da Espanha só raramente conseguiam escapar à infatigável vigilância e perseguições dos piratas. Em 1604, os holandeses penetram na Bahia e arrasam o Recôncavo, por onde fazem presas valiosas. E durante trinta anos, não deixam descanso às naus portuguesas e espanholas, ameaçando de forma continuada as mais prósperas povoações do nosso litoral. O sucesso desses ensaios animara os inimigos da Espanha, levando-os a conceber planos de ocupação efetiva do Brasil, até que, em princípios de 1624, parte para a América do Sul uma grande expedição, preparada pela Companhia das Índias Ocidentais. Compunha-se essa expedição de 36 navios e perto de quatro mil homens, sob o comando do almirante Jacob Willekens.

   Diogo de Mendonça Furtado, que em 1622 havia sucedido a D.Luís de Sousa no governo geral do Brasil, preveniu-se  como pôde do contra a iminência do ataque, pois a corte de Madri tratava com certa indiferença os negócios da colônia. Mas a demora da expedição fez acreditar, talvez, no fracasso da empresa. Assim, quando, finalmente, a 9 de maio de 1624, a esquadra holandesa se apresentou diante de Salvador, rompendo fogo contra a cidade e contra os navios ancorados, a resistência se tornou impossível. A despeito de alguma reação, a capital foi ocupada no dia seguinte, sendo Diogo de Mendonça [Governador Geral] preso e conduzido para a Holanda. No dia 11, o coronel Johan van Dorth assumia o governo da conquista em nome das Províncias Unidas, dirigindo um manifesto aos habitantes, convidando-os a confiar nas autoridades e a cooperar com os republicanos da Holanda, pela prosperidade de uma nova pátria.

    À primeira vista, os moradores da Bahia mostraram-se tão impressionados com aquela violência do ataque e posse da cidade, que os holandeses acreditaram piamente ter feito uma conquista definitiva. Aproveitando-se do êxito garantido, mais que tudo, pelo pânico instalado, os intrusos foram lançando suas vistas sobre outros pontos da costa. A maior parte dos navios holandeses deixou a Bahia, seguindo alguns para a Europa, carregados de despojos, e outros para o sul do Brasil, onde não encontraram as mesmas facilidades, sendo até repelidos energicamente no Espírito Santo. Entrementes, na Bahia, passado o primeiro susto, os moradores começaram a preparar a resistência.

    Segundo as vias de sucessão, na falta do Governador Geral, devia assumir o governo o capitão-mor de Pernambuco, Matias de Albuquerque. Na sua ausência, os patriotas nomearam como Governador o próprio Ouvidor Geral, mas, por falta de competência, este foi logo deposto e substituído pelo bispo D. Marcos Teixeira., que desenvolveu grande atividade e tornou-se a alma da reação. Por terra, de todos os lados, a cidade foi sitiada pelos brasileiros, que hostilizaram os holandeses a ponto de deixá-los numa situação desesperadora. A essa altura, já começava a chegar socorro de Pernambuco. O chefe holandês Van Dorth sucumbe, em luta com os sitiantes e seu substituto, logo depois, também teve a mesma sorte. A corte de Madri, afinal, resolve-se a agir e expede uma poderosa esquadra em socorro da Bahia. A esquadra compunha-se de forças espanholas e portuguesas, sob o comando de D. Fradique de Toledo e de D. Manuel de Menezes. Em fins de março de 1625, chega a expedição e estabelece o bloqueio. Os holandeses resistem mas, um mês depois, em 30 de abril, assinam a capitulação, retirando-se de volta à Europa apenas com suas armas de defesa e com víveres.

Os holandeses em Pernambuco (1630-1654)

   Logo depois da expulsão dos holandeses da Bahia, chegava uma esquadra de reforço para protegê-los. Sem se atrever a hostilizar a praça libertada, a esquadra flamenga, imediatamente, se fez vela para o norte. Quase pelo mesmo tempo, Pieter Heyn, de volta à pilhagem que fizera nas costas do sul, subiu de investida a São Salvador, assolando as imediações da cidade e aprisionando embarcações mercantes. Entretanto, sem recursos de guerra e desiludido, afinal de seus intentos, retirou-se para o mar das Antilhas, onde se tornou o flagelo dos espanhóis, arrebatando-lhes muitos navios carregados de tesouros.

    Os lucros fabulosos que a pirataria acabava de dar à Companhia das Índias, animaram os empresários a fazer novas tentativas nas costas do Brasil. Para isso, foi aparelhada uma poderosa esquadra de 70 navios, com uns seis mil homens de desembarque, sob o comando de Hendrik C. Lonck. O Brasil continuava quase que totalmente abandonado pela metrópole. O alvo da nova investida, agora, era Pernambuco e seu Governador, Matias de Albuquerque, se encontrava na Europa mas, assim que teve notícias do que planejavam os holandeses, voltara para o Brasil, sem, entretanto, trazer qualquer recurso de guerra. O Governador Geral era então D. Diogo Luís de Oliveira, mas dele não se podia esperar os necessários reforços. Os brasileiros, portanto, tiveram de cuidar da defesa por si próprios, cuidando de fortificar principalmente os portos de Recife,  Bahia e  Rio de Janeiro.

    A esquadra holandesa chegou, afinal, no dia 14 de fevereiro de 1630 e, no dia seguinte, o almirante ordenava a Olinda que se rendesse, enquanto o general Waerdenburch desembarcava um pouco acima, na praia do Pau Amarelo, com três mil homens. Como a vila de Olinda não se entregasse, foi atacada por mar e por terra. O terror se apoderou da população e Matias de Albuquerque compreendeu, logo, que a resistência seria inútil. Assim mesmo, em diversos pontos, o heroísmo dos pernambucanos se declarou numa luta desesperada de muitos dias, até que Recife caiu em poder dos assaltantes, como acontecera pouco antes com Olinda. Dominado o pavor da população, o general pernambucano fortifica-se sobre uma colina a cerca de uma légua para o interior, onde estabelece o Arraial do Bom Jesus.

    A grande alma de Matias de Albuquerque personificou, então, para brasileiros e portugueses, o espírito de pátria neste lado do Atlântico. Foi ele como que o primeiro grito de nacionalidade futura, gerada no sofrimento, a erguer-se da miséria colonial, fortalecida nas vicissitudes. Sem arrefecer de coragem ante os desastres, cuidou o chefe pernambucano de organizar a resistência. Criou as famosas companhias de emboscada, formidáveis quadrilhas de guerrilheiros, que não deixaram aos holandeses um momento de sossego. E aquela guerra que se vai travar teve caráter de uma verdadeira manifestação, forte e impressiva, do espírito novo que se criava na América, devido exclusivamente à aliança, nesse protesto, das três raças que contribuíram para a formação da pátria nascente: [o europeu, o índio e o negro.]

   Do Arraial do Bom Jesus, constituído em centro de reação aos intrusos, Matias de Albuquerque os hostilizava com repetidas refregas. Tendo recebido da Bahia um reforço de setecentos homens, ao mando do conde de Bagnuolo, tantos males causou aos holandeses que estes tiveram de abandonar Olinda e concentrar-se em Recife. Ao mesmo tempo, tanto no Rio Grande do Norte como na Paraíba, os usurpadores sofriam grandes reveses, o maior dos quais foi a derrota de sua esquadra pela de D. Antônio Oquendo. Para os holandeses, aquela conquista vai ser tormentosa, com que se há de, para sempre, castigar os seus intentos.

A heróica resistência dos pernambucanos

   A invasão holandesa [e nisso teve seu lado positivo] vem criar o período verdadeiramente épico da nossa história colonial. Pode-se dizer que, apesar de quase completamente desamparados pela metrópole, os pernambucanos não cessaram de protestar contra semelhante espoliação. Talvez com o intuito de desviarem de Pernambuco as atenções do governo geral, os holandeses iam atacando outras capitanias. O mau sucesso de seus intentos, porém, levou a ponto de desiludir a Companhia das Índias Ocidentais, até que, no meio de sua desfortuna, um bafejo inesperado de sorte vem reanimar os holandeses: foi a deserção de Calabar para o acampamento holandês. Natural de Porto Calvo [Alagoas], conhecendo perfeitamente a topografia daquelas paragens, o hábil guerreiro foi um poderoso auxiliar dos invasores.

    Guiados pelo desertor, os holandeses atacam, de noite e de surpresa, a povoação de Igaraçu [Pernambuco], tomando-a facilmente. Pouco depois, investem contra o forte do Rio Formoso [zona da mata] do qual também se apoderam, mas só depois de muitas lutas insanas, quando já não havia ali mais nenhum homem válido a combater. Estimulados com essas vitórias, atiraram-se contra o último reduto dos pernambucanos: o campo entrincheirado do Bom Jesus, em 14 de março de 1633. Todavia, foram dali repelidos e a audácia custou a vida de seu chefe Rembach, o qual sucedera Waerdenburch, quando este, ressentido com a Companhia, abandonara o comando geral das forças de terra. No lugar do chefe morto, assumiu Van Schkoppe, que ocupou Itamaracá, fazendo seguir um destacamento para Rio Grande do Norte, onde o forte dos Três Reis e outros postos foram conquistados.

    Os pernambucanos começavam a abater-se com tais derrotas e todas as vantagens do inimigo eram atribuídas a Calabar, alvo do ódio geral dos antigos camaradas. A não ser um pequeno revés na Paraíba, no mais, os holandeses iam, de sucesso em sucesso, avassalando toda aquela porção do Brasil, desde o Rio São Francisco até além do cabo de São Roque. O próprio Van Schkoppe, por fim, conquistou definitivamente a Paraíba e o domínio holandês parecia firmar-se em toda a vasta região. Só Matias de Albuquerque, com sua legião de insubmissos, continuava a afrontar o poderio dos inimigos no Arraial do Bom Jesus, no forte de Serinhaém, na fortaleza de Nazaré e em Porto Calvo,  Os pernambucanos tinham esperança de que lhes chegassem socorros da Europa, mas a frota capitaneada por Vasconcelos da Cunha foi desbaratada pelos holandeses e, dos seiscentos homens que vinham, apenas duzentos chegaram a Serinhaém.

    Em tão extrema conjectura, Matias de Albuquerque tentou ainda um esforço temerário, atacando Olinda, porém, não obteve sucesso. O esmagamento daquela bravura desesperada parecida inevitável. Porto Calvo [Alagoas] cai em poder do inimigo. O Arraial do Bom Jesus, ao cabo de três meses, tem de capitular, o mesmo acontecendo com a guarnição de Nazaré; apenas a posição de Serinhaém foi mantida, a custa de sacrifícios inauditos. Afinal, não sendo mais humanamente possível continuar naquele martírio inútil, o nobre chefe, desenganado pela imensa loucura, depois de ouvir em conselho os seus oficiais, deliberou a retirada para o sul, onde o conde Bagnuolo ainda se achava com alguma força.

    No dia 3 de julho de 1635 começou, pois, a retirada para Alagoas. Deixando terra e haveres, saíram então de Pernambuco quinhentos homens em armas e numerosas famílias, em número calculado de oito mil pessoas. Ainda assim, ao se aproximarem de Porto Calvo, foram atacados pelos holandeses, só que desta vez o inimigo foi derrotado. Em 22 de julho de 1635, Calabar é preso e punido cruelmente [foi enforcado]. Os emigrantes prosseguiram no seu êxodo para o sul. Com pouco mais de cinco anos de luta, os holandeses ficaram senhores daquele riquíssimo trecho do Brasil, compreendendo as capitanias de Pernambuco, Itamaracá, Paraíba e Rio Grande [do Norte].

Maurício de Nassau

   A corte de Madri parecia deliberada a dar tempo aos holandeses para firmarem no Brasil o seu domínio. Matias de Albuquerque já havia se retirado para o sul, quando chegou a expedição de D. Luís de Rojas y Borja, trazendo o novo Governador Geral.  Borja vinha com ordem de assumir o comando das tropas em lugar de Matias de Albuquerque, cujo devotamento à causa pátria não parecia agradar muito à Espanha. Matias de Albuquerque entregou o comando a Borja e foi enviado para a Europa, onde receberia o cárcere como prêmio de seu valor e abnegação. O general espanhol, por sua vez, foi imprudentemente tomando a ofensiva contra os holandeses, tendo a derrota como resultado, logo no primeiro encontro, com a morte do próprio comandante (combate de Mata Redonda).
    Nessa situação, Bagnuolo assumiu o comando das operações. Fortificou-se em Porto Calvo e dali dirigia tremendos bandos de guerrilheiros contra os intrusos que tanto dano lhes causavam. Nessa operação de guerrilhas, tornou-se famoso o negro Henrique Dias, o índio Antônio Felipe Camarão (Poti) e sua mulher Clara, além de muitos capitães de terra. Tão grave se afigurou aos empresários da Companhia das Índias essa situação a que se ia reduzindo a conquista, que julgaram indispensável uma pronta expedição de socorros e a investidura de um homem notável no governo do Brasil holandês. Esse homem foi Maurício de Nassau, que se fez, com efeito, uma das maiores figuras entre os que ficaram na história da colonização da América.

    O conde de Nassau chegou ao Recife no dia 23 de janeiro de 1637. Conforme as instruções que trazia, logo que assumiu o governo, marchou ele sobre Porto Calvo. Bagnuolo, por sua vez, fortificou-se nas imediações da vila de Olinda com cerca de quatro mil homens e, a 18 de fevereiro, os dois exércitos se encontraram. O combate, ali, tornou-se formidável, mas com prejuízo ao Brasil, já que Bagnuolo teve de capitular, retirando-se para a Bahia. Nassau ficou, portanto, senhor daquelas paragens, até o rio São Francisco e na foz deste, levantou o forte Maurício (cidade alagoana de Penedo). Voltando para Recife, deixou em Alagoas o infatigável Schkoppe, empenhado em perseguir os guerrilheiros de Bagnuolo.

    Enquanto cuidava dos negócios da administração, o governador ia recebendo notícias que lhe davam como iminentes novas e sérias agressões preparadas na Bahia e sua opinião, coincidente com a do Conselho dos Dezenove (que dirigia a Companhia das índias Ocidentais), era a de tentar alguma coisa contra a capital do domínio espanhol. Nassau tomou, portanto, a resolução de atacar São Salvador e para ali partiu, com quarenta navios e cerca de quatro mil homens de desembarque. Chegando à Bahia, tomou logo posição e sitiou a cidade, vendo-se, porém, continuamente hostilizado pelas temerosas quadrilhas de assalto.

    Finalmente, reunindo suas  forças, Bagnuolo vai socorrer a cidade em perigo, forçando Nassau a levantar o sítio e retirar-se para Recife. A essa altura, a corte de Madri começou a inquietar-se com o incremento que, no Brasil, iam tendo as conquistas da poderosa Companhia, já que os holandeses, estabelecidos nas quatro capitanias do norte, não deixavam de revelar seus intuitos de dominação. Assim, resolveu a metrópole espanhola nomear D. Fernando de Mascarenhas, conde da Torre, como Governador Geral do Brasil, dando-lhe incumbência especial de exercer uma ação enérgica e decisiva contra os intrusos.

A luta continua

   A 19 de janeiro de 1639, chegava à Bahia o conde da Torre, trazendo com ele uma boa esquadra de reforço. Além disso, fez reunir os navios e tropas disponíveis em diversos pontos da colônia e organizou uma poderosa esquadra de uns noventa navios bem guarnecidos. A expedição devia partir para Pernambuco ao mesmo tempo em que marchavam, por terra, as tropas destinadas a operar combinadamente com as forças do mar. O próprio conde da Torre assumiu o comando em chefe da esquadra. Já as forças de terra eram dirigidas pelos chefes Vidal de Negreiros [que mais tarde comandou a Insurreição Pernambucana], Felipe Camarão [o índio], e, entre outros mais, Luís Bezerra Barbalho.

    As duas esquadras se encontraram perto de Itamaracá, no dia 12 de janeiro de 1640, travando-se violenta batalha, tendo os flamengos [holandeses] não pequenos reveses, sendo que, logo no começo da ação, vítima da própria temeridade, morre o almirante Cornellison. Todavia, o impávido Huyghens, vice almirante, assume o comando da esquadra e persegue os navios brasileiros com uma coragem e tenacidade quase inverossímeis. Então, o conde da Torre tem de resistir aos ímpetos inimigos em diferentes pontos da costa, cada vez mais afastando-se para o norte. O último combate, travado junto à foz do rio Potengi [Ceará] foi uma verdadeira ruína.

    O Governador Geral, conde da Torre, mal conseguiu recolher-se de volta à Bahia. Alguns navios, perseguidos pelos holandeses, fugiram para o norte, indo uns poucos até o mar das Antilhas [América Central]. Uma nota de heroísmo destacou-se daquele desastre. Não podendo escapar da vigilância do inimigo, a guarnição de muitos dos navios batidos resolveu desembarcar num porto do Rio Grande [do Norte], dali seguindo por terra até a Bahia, sendo essa coluna comandada pelo capitão Luís Bezerra Barbalho. Em toda a longa e penosa marcha de quatrocentas léguas, aqueles bravos homens foram agredidos pelos inimigos e tiveram de resistir a constantes refregas, chegando à Bahia com um desfalque de apenas 100 homens, dos 1.500 ou 2.000 que saíram do Rio Grande do Norte.

    O conde da Torre, após esse fracasso, recebeu ordem de voltar a Lisboa, onde também foi encarcerado, na torre de São Julião. Em seu lugar, veio D. Jorge de Mascarenhas, marquês de Montalvão, não mais como governador, mas com o título de Vice-Rei e Capitão General de Mar e Terra. Trazia também, como primeiro empenho, a restauração do domínio. Porém, achando-se desprovido de recursos suficientes de guerra, procurou ganhar tempo e criar os elementos de que necessitava. Antes de tudo, tratou de sondar os ânimos, para ver se podia apoiar um grande plano de ataque, numa insurreição geral dos pernambucanos. O chefe holandês, porém, compreendeu logo a tática de Montalvão e burlou-lhe as maquinações, dissimulando-se habilmente com mostras de cordialidade, chegando até a propor-lhe um pacto de trégua.

    O conde Maurício de Nassau, apesar de todas as vitórias que havia alcançado, lutava também com certas dificuldades em Recife, as quais lhe eram causadas principalmente pela ganância dos empresários da Companhia das Índias. Nassau, desde muito, reclamava tropas de reforço e navios para a ronda da costa e o Conselho dos Dezenove, sem nunca atender a tais reclamos satisfatoriamente, insistia sempre em recomendar a conquista da Bahia. Quando o marquês de Montalvão [vice-rei] chegara à capital da colônia, em 1640, ainda havia vestígios das depredações que os holandeses fizeram por todo o Recôncavo, em obediência às ordens que lhe vinham da metrópole. Todos os intentos de Nassau contra a Bahia se limitaram a isso, pois, com os escassos recursos de que dispunha, não haveria de comprometer a sorte da conquista, aventurando-se em tentativas, cada vez mais perigosas, pois agora iria encontrar os baianos mais prevenidos.

A obra de Nassau

   Pode-se afirmar com segurança que, sem o conde de Nassau, os holandeses não teriam se conservado tantos anos no Brasil. As grandes qualidades deste homem chegaram a impor-se a uma boa parte das próprias populações violentadas. E não fossem os erros e a descarada ambição da Companhia das Índias, com a qual o príncipe se fizera logo incompatível, quem sabe lá quanto a fisionomia da política na América Oriental poderia ter-se modificado, sob a influência holandesa. Maurício de Nassau veio com o título de General de todas as forças de mar e terra, e Governador dos povos conquistados e dos que viesse ele próprio a conquistar. Todo o governo e administração do domínio se regia por uma espécie de constituição.

    Nos termos dessa constituição, a autoridade suprema era exercida por um Grande Conselho, presidido pelo príncipe. Essa assembléia, na qual até brasileiros dos mais notáveis tiveram assento, foi como um primeiro ensaio de sistema representativo na América do Sul. Como dissemos, Nassau era um homem de excelentes aptidões para a função de governo e, se tivesse vindo em outras condições, talvez teria se constituído no Brasil um regime conduzido pelo povo. É de se acreditar, mesmo, que as intenções de Nassau não andassem longe disso, e que o seu grande pensamento, ao vir para cá, seria criar uma segunda pátria, onde o gênio dos Orange [casa real] pudesse expandir-se amplamente. Entrou ele em nosso país, não se sabe se mais jubiloso que maravilhado: "É um dos mais belos países do mundo!" foi o que escreveu logo para a Europa. Espírito culto e liberal, mais patriarca que conquistador, começou ele o seu governo procurando inspirar aos povos uma razoável confiança na ordem de coisas que vinha instalar.

    Enquanto sustentava a guerra fora da colônia, certamente com o intuito de revelar sua força, afastando a possibilidade de agressões, mantinha a paz dentro de sua colônia tão bem quanto possível, de tal sorte que se estabeleceu uma certa concórdia entre holandeses e brasileiros. A par do notável impulso que tiveram logo todas as indústrias, e principalmente a lavoura e a criação, desenvolviam-se também as artes liberais e os estudos que, mais particularmente, interessavam ao país. O príncipe atraía da Europa homens de letras, pintores, escultores, mecânicos, arquitetos e naturalistas. A ilha de Antonio Vaz, que pela primeira vez foi ligada a Recife e à Boa Vista por pontes elevadas, que permitiam a passagem de embarcações pelo rio, sofreu transformações que lhe deram segurança e praticidade.

    Fez construir ali o primeiro observatório astronômico que se erigiu nesta parte do continente e, talvez, em toda a América. Num de seus palácios da cidade Maurícia, por ele construída e embelezada, fundou também um museu de história natural e uma espécie de academia de ciências e letras. Uma larga e magnífica alameda de palmeiras ligava os dois principais palácios. Naqueles paços monumentais, o príncipe tinha a sua corte de sábios e poetas. Na academia, celebravam-se sessões em que eram discutidos problemas vários, assim como teses científicas e literárias. Ali trabalhavam os artistas que ele protegia, e não foram poucas as obras que se produziram e que, mais tarde, quando ele se retirou, foram constituir na Europa sua única fortuna pessoal. Não era demais, portanto, que o Pernambuco daqueles tempos tivesse, pelo seu esplendor, se tornado famoso em todo o Brasil.

    No entanto, aquela prosperidade da Nova Holanda, milagre do espírito de um homem, ia ser em breve interrompida. A política liberal de Nassau descontentava a todos os especuladores e logo as intrigas começaram a se criar na Europa, entre os republicanos e a gananciosa Companhia, lançando suspeitas contra os verdadeiros intuitos do príncipe. O tremendo Conselho dos Dezenove mostrava-se cada vez mais autoritário, mais exigente e mais prevenido contra o vasto prestígio que Nassau ia firmando na América. Primeiro, o príncipe contemporizou, cedendo o mais que era possível, chegando a desmanchar muita coisa do que tinha feito; depois, quando sua paciência não podia ir mais longe, desgostoso, deliberou abandonar o posto. Em 1644, depois de haver passado o governo da colônia a uma Junta, Nassau retirou-se para a Europa, embarcando no porto da Paraíba em 22 de maio do mesmo ano, depois de sete anos de profícuo trabalho no Brasil. A retirada de Nassau marca a fase de decadência do domínio holandês. 

Restauração de Portugal

   O marquês de Montalvão, primeiro vice-rei do Brasil, acabava de chegar à Bahia, em 1640, e estudava, ainda, a situação dos negócios, quando se teve notícia da revolução que restaurara a soberania de Portugal, colocando no trono o duque de Bragança, sob o nome de D. João 4º. Só em princípios de 1641 chegava ao Brasil essa notícia, recebida com vivo entusiasmo por uns, mas com certa incredulidade e algum receio por outros. O vice-rei do Brasil mostrou-se um tanto indeciso, ou cauteloso demais, naquela conjuntura, cuidando sobretudo da atitude que viesse a assumir a tropa espanhola que nos fazia a guarnição. Com muito jeito, tomou providências no sentido de ir isolando essa tropa, sem dar muito à vista. Convocou, em seguida, um conselho de notáveis, para deliberar quanto à aclamação do novo rei.

    No Rio de Janeiro e em São Paulo, por influência dos Jesuítas, D. João 4º foi logo reconhecido, apesar de alguma hesitação. Em São Paulo, ao que parece, registrou-se até insinuações quanto a uma separação: foi nesta época que a astuciosa colônia espanhola animou os patriotas a aclamar Amador Bueno, rico e prestigioso chefe político, como seu rei. Este, porém, declarou-se fiel à monarquia e ao novo soberano e, assim, o partido da independência desanimou. Os padres, em muito contribuíram para essa decisão de Amador Bueno e, por isso, se tornaram alvo da antipatia e do ódio dos paulistas, a cujas hostilidades muito lhes custou resistir, sendo até expulsos de quase toda a capitania. Todavia, para ali voltaram mais tarde, amparados por D.João 4º, sem que, entretanto, conseguissem restaurar sua antiga ascendência sobre a população.

    Enquanto tudo isso se passava no sul, O vice-rei Montalvão, na Bahia, ia contemporizando. Queria ele, primeiro, sondar a reação dos holandeses com relação aos inesperados acontecimentos da península. Talvez chegasse mesmo a acreditar que a situação no Brasil se modificasse a favor dos portugueses, já que a Holanda [ex-colônia espanhola] dizia sempre que hostilizava a Espanha, e não Portugal. Maiores motivos teve para tais esperanças, quando viu o governador holandês receber gentilmente a comunicação que o vice-rei lhe fizera, por carta, de tudo quanto acabava de ocorrer na Europa. Nassau [ainda era ele quem governava] mostrou-se muito grato com aquela cortesia e, em honra ao novo monarca, deu ordem para que as fortalezas do Recife comemorassem com salvas de canhão.

    Com tais excessos de prudência, no entanto, Montalvão desagradou o partido dos nacionalistas radicais que queriam, ao mesmo tempo, que se reconhecesse o novo rei, e que se continuasse a guerra contra os holandeses. À frente desse partido exaltado estavam o bispo D. Pedro da Silva Sampaio e o jesuíta Francisco de Vilhena, aquele mesmo que, vindo de Portugal, se fez portador da carta régia, comunicando ao vice-rei o sucesso da revolução portuguesa. Vilhena e o bispo tramam contra Montalvão e este é deposto, preso e enviado para Lisboa. Organizou-se, então, uma Junta provisória, composta pelo próprio Bispo, mais Luís Barbalho de Bezerra, que era mestre de campo, e também Lourenço de Brito Correia, Provedor- Mor da Fazenda.

    Entram, então, as relações diplomáticas de Portugal com a Holanda, numa fase de dissimulações e dubiedades, que, embora acontecendo na Europa, não podiam deixar de ter seus efeitos políticos nos respectivos domínios aqui no Brasil. Enquanto, de um lado,  se firmava um tratado de aliança entre as duas nações, estabelecendo um armistício de dez anos, de outro, a insaciável Companhia das Índias dava ordem ao seu preposto no Brasil para que ampliasse as conquistas feitas, tirando proveito  da situação de fragilidade em que ficavam, momentaneamente, os domínios portugueses. Assim, não obstante a homenagem que Nassau prestara a D. João 4º, teve de desmentir sua boa fé, deixando que os holandeses avançassem para o sul, até as fronteiras da Bahia [até o rio Real, entre os Estados da Bahia e Sergipe]; para o norte, até o Ceará e o Maranhão.

Insurreição geral contra os holandeses

   Os brasileiros não se satisfaziam com a dúbia política que a metrópole aconselhava, e pior ficou quando viram a deslealdade com que os holandeses iludiam o tratado de suspensão de armas. O desgosto geral, porém, converte-se em verdadeira indignação quando se conheceram os termos desse tratado. Por ele, o rei de Portugal reconhecia o domínio holandês na América do Sul e ainda se estabeleciam odiosos privilégios e favores excepcionais em proveito daqueles mesmos que os independentes continuavam a considerar como simples intrusos. Aos holandeses era assegurado até o monopólio, senão do comércio, pelo menos da navegação. Quando aqui se soube de tudo isso, não foi mais possível conter a insurreição geral.

    Essa revolta começou em 30 de setembro de 1642, pelo Maranhão que, por fraqueza ou inépcia de Bento Maciel, caíra nas mãos dos usurpadores, e onde as populações sofriam toda sorte de violências e vexames. Antônio Muniz Barreiros, à frente de um bom número de patriotas, surpreende, de noite, o forte de Itapirucu, extermina-lhe a guarnição e proclama a guerra. Durante mais de um ano, luta-se ali desesperadamente. Falecendo o velho Muniz Barreiros, assume o comando dos revolucionários o sargento-mór Antônio Teixeira de Melo. Enquanto os intrusos recebiam auxílio dos seus, engrossavam as legiões de insurgentes com reforços que afluiam das capitanias vizinhas. Afinal, em 1644, os holandeses tiveram de se retirar para o Ceará e em seguida para o Rio Grande do Norte.

    A notícia deste primeiro sucesso espalhou-se por toda a parte como uma voz de repique, como se apenas se estivesse à espera daquele instante. Em lugar do marquês de Montalvão, tinha sido nomeado Governador Geral do Brasil o benemérito Antônio Teles da Silva, que tomou posse em 26 de agosto de 1642 e veio da Europa já prevenido contra os flamengos. Desta forma, passou a agir em acordo com muitos patriotas, entre eles um grande senhor de engenhos, João Fernandes Vieira, a quem se reservava um notável papel nas lutas da restauração. Com a vitória dos independentes no Maranhão, coincidia a retirada do conde de Nassau, ficando o governo da colônia holandesa entregue a pulsos menos firmes.

    Em junho de 1645, rompia a insurreição em Pernambuco. Logo no primeiro encontro, os patriotas alcançaram a vitória do monte das Tabocas. O desbaratamento dos holandeses foi completo e os que sobreviveram, aproveitando a noite, puseram-se em fuga desordenada para Recife [ainda capital da Nova Holanda]. Esta vitória produz entusiasmo geral entre os brasileiros. Fernandes Vieira é aclamado general da revolução e, reunindo-se a Vidal de Negreiros [herói de revoltas anteriores] leva a efeito uma tremenda ofensiva, em vários pontos, simultaneamente, o que assusta os inimigos. Em breve, rendem-se os fortes de Serinhaém, Nazaré, Santa Cruz, e a própria vila de Olinda não tardou em cair nas mãos dos insurgentes. Na Paraíba e em Alagoas, ganhava terreno a causa da libertação.

    Como centro de operações, formaram os pernambucanos um vasto arraial fortificado (Arraial Novo do Bom Jesus), onde se iam abrigar todos os brasileiros em cujo peito despertava, agora mais veemente, o amor da antiga pátria. Fernandes Vieira foi, então, solenemente, aclamado Governador de Pernambuco. É por esse tempo que Vieira, e outros grandes chefes da guerra, dão um brilhante exemplo de abnegação e altivez, resistindo a ordem impensada do Governador Geral, que mandava incendiar os canaviais, como expediente destinado a privar de recursos os inimigos. E isso fizeram aqueles heróis, reduzindo a cinzas as próprias lavouras!

Fim do domínio holandês

   Os independentes sitiam o Recife. Schkoppe, que tinha chegado em socorro dos seus, foi repelido em diversas investidas. Movendo-se apenas com suas forças navais, os sitiados procuraram dispersar a atenção dos revoltosos para outros locais e, nesse sentido, os holandeses atacaram vários pontos marítimos. Mas, inutilmente, Schkoppe se apoderou da ilha de Itaparica e assolou o recôncavo da Bahia. Foi-lhe necessário, logo depois, voltar apressadamente a Recife, onde se tornava cada vez mais crítica a situação de seus compatriotas. Somente agora o governo da Holanda se lembrou do acordo que fizera, e pôs-se a reclamar da corte portuguesa a fidelidade a esse tratado de paz. Pois aconteceu que o ingênuo rei D. João 4º deu razão aos holandeses e ordenou aos insurgentes brasileiros que cessassem as hostilidades!  Mas os pernambucanos não vacilam e desobedecem formalmente a ordem real, declarando que, depois de expulsar os intrusos, estariam prontos a sofrer o castigo pela sua desobediência.

    Como a Holanda se achava muito irritada e preparava grandes recursos bélicos destinados à proteção de sua conquista na América, tremeu o rei português e resolveu destituir Teles da Silva, nomeando como novo Governador Geral do Brasil, a Antônio Teles de Menezes, conde de Vilapouca de Aguiar. Ao mesmo tempo, no entanto, vinha o general Francisco Barreto de Menezes, incumbido de reconciliar alguns dos insurretos que andavam em divergência, o qual, após sofrer um desastre e de ser até aprisionado, conseguiu iludir a vigilância do inimigo e alcançar o acampamento pernambucano, onde, em 1648, assumiu o comando em chefe da insurreição. As vitórias que os patriotas conquistavam quase que diariamente iam desanimando os holandeses, reduzidos agora aos postos de Recife, Paraíba, Natal, Itamaracá e Fernando de Noronha, isto apesar dos sólidos e contínuos reforços que vinham recebendo da metrópole.

    Desesperado, Schkoppe reune uma grande coluna de cerca de cinco mil homens, rompe afoitamente o sítio de Recife e, em 19 de abril de 1648, a três léguas dali, nas imediações dos montes Guararapes, trava com os insurgentes uma batalha campal. Foi inútil. Os brasileiros infligem ao inimigo uma completa derrota. Schkoppe, ferido, retira-se para Recife e ali recompõe as forças flamengas, à frente das quais não demorou em marchar o coronel Brinke, incumbido de tomar de novo a ofensiva contra os rebeldes. Todavia, a segunda batalha dos Guararapes, ocorrida em 19 de fevereiro de 1649, dá ensejo a nova e ainda mais estrondosa vitória dos brasileiros. O domínio holandês no Brasil parecia, portanto, em vésperas de ruir. E, no entanto, completamente desamparados da sua metrópole, os patriotas de Pernambuco tinham ainda muitos anos de sacrifício a vencer.

    Em 1650, o conde de Villapouca de Aguiar foi substituído no governo geral por João Rodrigues de Vasconcelos e Sousa, conde de Castelo-Melhor. Nesta altura, a Holanda, assim como Portugal e Espanha, estava em conflito com outra potência, a Inglaterra e, por essa razão, não tinha condições de continuar a socorrer os intrusos. Por outro lado Portugal seguia o exemplo de outros países e estava organizando uma Companhia de Comércio que, entre outras atribuições, deveria proteger as colônias e o comércio marítimo do reino. De começo, os socorros que vieram aos insurgentes, de pouco valeram mas, em 1653 chegou Pedro Jacques de Magalhães com uma esquadra de sessenta navios, a qual imediatamente bloqueou Recife, enquanto os pernambucanos, por terra, apertavam o sítio. Foi Schkoppe sendo desalojado dos fortes que ainda ocupava e, por fim, concentrou na cidade os seus últimos elementos de resistência, protegido pela fortaleza de Cinco Pontas.

    O heróico Vidal de Negreiros, ferido diante daquela praça de guerra, ainda assim ordena e comanda o assalto, mas o general inimigo não podia mais se defender: propõe e consegue a capitulação, em 26 de janeiro de 1654. Os holandeses se retiram do Brasil no dia seguinte, para nunca mais voltar. Assim, os patriotas faziam a sua entrada solene e triunfal na terra libertada.


    Findara, depois de vinte e quatro anos, a ocupação holandesa, sem que se possa dizer, entretanto, que nos foi um grande mal, pois foi naquelas lutas que, incontestavelmente, se formou a consciência de nacionalidade, de uma pátria futura e que, se em algum momento vacilou, foi por circunstâncias meramente acidentais.

Fonte em http://www.pitoresco.com/