LAMPIÃO
convocado para fazer parte do Batalhão Patriótico do Juazeiro do ‘Padim Ciço’
A Coluna Prestes transpôs o
rio Parnaíba, penetrando no Piauí. E a 18 de janeiro de 1926 atingiu a cidade
de Picos, no Piauí, próximo do Ceará, ameaçando assim o Cariri.
O Deputado Floro Bartolomeu, investido
pelo Presidente da República com a patente de General, para combater a Coluna
Prestes, chegava ao Juazeiro com uma numerosa quantidade de munição, armas, fardamentos
e com muito dinheiro no bolso para fazer frente às despesas de uma empreitada
dessas.
As restrições que Lampião
fizera ao Batalhão Patriótico onde mostrou com suas palavras a falta de
disciplina e de um uma escolha de oficiais de comando sem tática, deixou o
general desgostoso com ele. Floro Bartolomeu não conseguiu entender até então o
que o guerrilheiro mais famoso do Brasil, naquela época, queria dizer e por
isso macambúzio veio a relevar a provável ajuda. Quando Floro se convenceu que
Lampião tinha razão, mandou logo procurá-lo para entregar-lhe, com a patente de
Capitão, um dos comandos de vanguarda do Batalhão Patriótico.
— "Lampião é
bandido!" diziam uns.
— "A História” -
replicava Floro, “está cheia de bandidos que se regeneraram, tornando-se
grandes homens e até fundadores de império e nações”.
A importância dada a Lampião
e seus cangaceiros pode ser sentida por quem conhecia por demais suas proezas e
suas táticas de guerrilheiro. Um guerrilheiro bem treinado, vale por cem
soldados imberbes ou despreparados. O pequeno bando de Lampião, de cerca de 50
homens valia por 5.000. Fico impressionado, pelas táticas desse homem que nunca
veio a ter um preparo militar de caserna. Era guerreiro nato como muitos da
história humana.
Era um cabra destemido e
valente. Não significando que em algumas fugas do combate, mereça o adjetivo de
covarde, assim como alguns infelizmente pensam. Essa é a tática de guerrilha
usada em diversas partes do mundo. Para um inimigo poderoso, um ataque e um
recuo para não perder forças. Apenas quando Lampião sentia que o enfrentamento
era possível, tiroteava por diversas horas com seus inimigos.
A política da época dos
coronéis do sertão, o usava de diversas formas, tornando-se seu aliado quando
se tirava vantagem e mostrando-o como um bandido sanguinários quando isso lhes
era de ajuda.
Lampião
Regenerado
Somente na mente de um homem
voltado para a salvação das almas sertanejas que padeciam pelo abandono do
poder público, poderia conceber um plano desses. Padre Cícero já tinha feito
que um cangaceiro abandonasse a vida de crimes e enveredado nos caminhos da lei
e da ordem, por que não fazia o mesmo com Lampião?
Foi então expedida a ordem
de convocação, em cartão oficial, com o timbre do Batalhão Patriótico, Floro assinou
e convocou com urgência Lampião. Na casa
do padre Cícero foi chamado João Ferreira, que admitiu seu irmão estar pelas
zonas do Pajeú ou do Navio. Padre Cícero então escreveu uma carta ao Coronel Né
Pereira, da Carnaúba, em Vila Bela, chamando seu filho, como dizia ele, para se
render ao patriotismo, combatendo uma força ilegal, que avançava para o Ceará e
com intentos de invadir a terra santa do Juazeiro.
João Ferreira, irmão de
Lampião, não quis servir de portador daquela convocação e então foi escolhido e
incumbido o Tenente Francisco das Chagas Azevedo, comandante da Trigésima
Terceira Companhia do Batalhão Patriótico, que ao chegar em seu destino, a
fazenda Carnaúba, apresentou-se ao Coronel Né Pereira, que não fez demora,
enviando três ou quatro pessoas, por diferentes direções, para ver se
encontrava Lampião. De logo, o encontraram. Suspeitando de cilada, recusou
Lampião atender ao chamado, tão somente depois que examinou bem a assinatura do
Padre Cícero, cuja letra lhe era familiar, é que se decidiu ir ao Juazeiro.
De imediato, Lampião, agora
com quarenta e nove homens, se pôs nas veredas, na direção do Cariri, em busca
da patente almejada e para atender seu padrinho santo.
Era de manhã cedo, quando Lampião
subiu a serra do Araripe. Ia a cavalo com os seus cabras. Mas receoso,
deteve-se ele antes de entrar no pequeno povoado chamado Macapá, hoje Jati, que
tinha uma força pública comandada pelo Tenente Luís Rodrigues, mandou-lhe uma
carta de apresentação e anexou as de Floro e do Padre Cícero.
Após a leitura, o tenente,
devolvendo ao portador as missivas, dizendo-lhe que Lampião podia ficar
despreocupado, pois não haveria inguirizia e que aquele documento apresentado
por ele, era um passaporte legal e que as portas daquele povoado estavam
abertas para Lampião e seus comandados.
Às três horas da tarde,
entrou o Rei do Cangaço, em Macapá, com seu grupo. Viajando em meus
pensamentos, os vejo, e minha alegria de admirador não do bandido que era, mas
de um homem que fez sua história e deixou gravado nos corações dos nordestinos,
e porque não dizer, do Brasil e do mundo quase todo, na escrita e na tradição
boca a boca. Todos montados, firmes e olhando pra frente com seus corpos
retesados, garbosos, trotando pomposamente, em desfile como sendo o salvador do
povo cearense contra a coluna que queriam destruir as terras de ‘Padim Ciço”.
Porte de majestade, o Rei dos cangaceiros ia na frente, em um cavalo que
imagino branco, mas que segundo o povo, era ruço. Estava ladeado à sua direita
por seu irmão Antônio e à esquerda por seu Lugar-Tenente o cangaceiro Sabino, “os
três puxando a fila dupla, marchando de costado, com vinte e três pares de cavaleiros
e fechada por Luís Pedro, sozinho.”
A maioria dos cangaceiros,
cabras acostumados aos combates era pernambucanos. Uns de Vila Bela, outros de Floresta
e do Pajeú de Flores. Mais alguns de Triunfo. Tirante Pai Velho sendo o mais
idoso, o resto da cabroeira entre 18 e 30 anos de idade. “E com exceção de
alguns curibocas e dois negros, os demais de cor branca, ou amorenados. Na
residência de uma idosa senhora, D. Generosa, se reuniram Lampião e seu Estado
Maior (Antônio Ferreira, Sabino e Luís Pedro) juntamente com os Tenentes Luís
Rodrigues Barroso e Veríssimo Alves Gondim (comandante de volante), o sargento
Antônio Gouveia e outros agaloados componentes da polícia militar cearense,
para uma conversa informal, amistosa e animada, servida de galinha assada e
regada a vinho cerveja. Lá fora, cangaceiros, soldados e povo em perfeita
harmonia. Quase consumido o estoque de cigarros, fósforos, bolachas, vinho e
perfume da bodega do comerciante Moisés Bento, que gostava de
"despachar" os cangaceiros, fregueses esses bons pagadores.”
Lampião não gostava de dever
a ninguém, exceto sua ira revoltada contra o sistema que o oprimia e por isso requisitou,
pagando corretamente, todas as galinhas dos quintais para mantença de seu
bando. Depois, no meio da rua, ordenou Lampião ao sanfoneiro tocasse
"Mulher Rendeira". E, enquanto improvisava loas, os cabras, em roda
formada, xaxavam e cantavam o famoso estribilho:
— "Olê Mulé Rendêra ,
ô, mulé rendá, Chorô pru mim num fica
Saluçô vai no borná"
“A vibração dos acordes
desta canção guerreira contagiou os militares e todo o povo. De súbito,
entusiasmados, todos imitavam os alegres visitantes...
Horas inesquecíveis, de
alegria e festa, as que Lampião veio trazer àquele pedaço de sertão perdido no
Cariri! Durante as despedidas, entregou Lampião ao Tenente Veríssimo um bonito
revólver niquelado "Chimite" ("Smith and Wess"), para ser
oferecido, como presente, a seu amigo ausente - Capitão Honorato dos Santos
Carneiro, da polícia do Ceará.
Prosseguindo na viagem,
passou por Porteiras, indo pernoitar no sítio Laranjeiras, cujo proprietário,
Antônio Pinheiro, fez troca dos animais cansados e inferiores do grupo,
fornecendo outros melhores.”
Daí Lampião e seu bando, partiram
como salvadores da pátria e com peitos estufados de orgulho patriótico,
entoavam o hino "Olê Mulé Rendêra ,
ô, mulé renda...”.
O Sonho de um Sonhador
Parece que eu estava lá. Em
minha mente buliçosa, viajava antes que um piscar de olhos estalasse, vendo
aquela alegria contagiante. Lembrou-me, mal comparando, e que Deus me perdoe,
do Rei Davi, quando voltava à Jerusalém com a Arca da Aliança, recuperada dos
Filisteus, onde o povo cantava e tocava seus instrumentos cantando e louvando a
Deus por Davi a ter recuperado.
Marchei junto com eles sem
que eles me notassem. E notei a satisfação no rosto de Virgulino Ferreira da
Silva, que queria se ver livre de Lampião, e esta era sua oportunidade. Queria
ser uma pessoa comum. Era seu sonho e eu no meu sonho, entrava no seu sonho. Queria criar seu gadinho e ter sua roça de algodão e
macaxeira. Talvez até mesmo em seus sonhos proféticos, tenha visto sua Maria
Bonita, esperando por ele, para criarem em paz os seus filhos.
Infelizmente os homens de
poder e os invejosos, não deixaram, uma pena...
Fontes de partes da matéria: