O livro de Raul Meneleu mergulha na complexa teia social, política e cultural do Nordeste brasileiro no início do século XX, centrando-se na figura emblemática de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, e no fenômeno do cangaço. A obra explora como as condições históricas da região — marcadas por secas cíclicas, desigualdades brutais e o poder oligárquico dos "coronéis" (grandes latifundiários) — alimentaram a violência e o banditismo.
Meneleu contextualiza o cangaço não apenas como criminalidade, mas como um reflexo de resistência e sobrevivência em um ambiente hostil. Lampião surge como líder astuto, cuja habilidade estratégica e carisma o transformaram em símbolo ambíguo: tanto um "justiceiro" para os oprimidos quanto um bandido temido. O autor analisa como sua atuação desafiava a autoridade dos coronéis, que mantinham controle através de "capangas" e "jagunços" (pistoleiros contratados), criando um cenário de conflitos armados e alianças instáveis.
A obra também discute a estrutura de poder coronelista, destacando a fragilidade do Estado na região, que permitia a esses líderes locais governarem como senhores feudais. Meneleu contrasta a violência dos cangaceiros com a dos jagunços, enfatizando que ambos eram produtos de uma sociedade desigual, embora servissem a interesses distintos.
Além da análise histórica, o livro aborda o legado cultural de Lampião, mitificado na literatura de cordel e no imaginário popular, e reflete sobre como sua história ilustra tensões entre opressão e resistência. Meneleu não romantiza o cangaço, mas reconhece seu papel na exposição das fissuras sociais do Nordeste.
Conclusão: A obra de Meneleu oferece uma visão multifacetada do Brasil rural, unindo história, sociologia e cultura para explicar como figuras como Lampião e instituições como o coronelismo moldaram a identidade nordestina. É um estudo essencial para compreender as raízes da violência e da luta por poder em um contexto de abandono estatal e injustiça estrutural.