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segunda-feira, 14 de agosto de 2017

NEGROS DOS PONTÕES

NEGROS DOS PONTÕES OU DOS ESPONTÕES E A RELAÇÃO COM A CONFRARIA

Vídeo produzido por
https://www.facebook.com/jtavaresnet/videos/945648108829856/?hc_location=ufi

São três os grupos que compõem os eventos voltados aos festejos do rosário na cidade de Pombal, mas apenas . Pontões estão intrinsecamente ligados à Irmandade e à devoção ao rosário. O Reisado não é um grupo típico das festas dos Negros do Rosário. Câmara Cascudo, em seu Dicionário do folclore brasileiro, diz que Reisado é a denominação erudita para os grupos que cantam e dançam na véspera de dia de Rei. Em Pombal, o Reisado foi incorporado à Festa dos Negros do Rosário no inicio da década de 1960. Os Congos (Congo ou Congada) são danças cujo objetivo, assim como o Reisado, é celebrar as festas de Natal, de Reis e do Divino Espírito Santo, mas que também foi incorporado aos festejos de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito e, por fim, os Negros dos Pontões. Apenas esses últimos, Negros dos Pontões, ou dos Espontões, estão diretamente ligados à Irmandade dos Negros do Rosário, em todas as ocorrências no Brasil, e formam o único grupo a sair às ruas a partir do nono dia que antecede o domingo do encerramento da festa. É formado, desde a sua origem, por membros de uma mesma família: os Rufinos, que descendem de negros escravizados residentes originalmente na zona rural, em terras herdadas dos seus antigos senhores, o que reforça a hipótese de Manoel Cachoeira e Joaquina da Vassoura virem a ser do tronco da família RUFINO, hipótese que é comungada por João Coremas, que informou não ter chegado a conhecer os dois, mas que conviveu com Francisco Rufino, rei que sucedeu Manuel Cachoeira, provavelmente entre 1950 e 1952.

O povo de Pombal se costumou a chamá-los pela denominação Os Negros dos Pontões mas, segundo Câmara Cascudo, o correto seria Os Negros dos Espontões* e a Dança dos Espontões. A sua formação não tem um número Exato de pessoas, porém é o mais numeroso entre os três grupos, constituído apenas por homens. Exibem-se em dois cordões, encarnado e azul. Até o final da década de 1960, todos trajavam vestes brancas. O que diferenciava os cordões eram as cores dos lenços que os componentes traziam em volta do pescoço: azul e vermelho. Nos dias atuais, o grupo trajam chapéus de palha enfeitados com fitas coloridas, e nas mãos trazem lanças (pontões) terminados em maracás, enfeitados também com fitas multicoloridas. As lanças são para abrir caminho na multidão durante a procissão como para fazer as figurações na dança e marcar ritmo da música entoada por urna banda formada por um fole, pifano, prato, caixa, tambor e pandeiros. O grupo não canta.

Os Negros dos Pontões têm um caráter semelhante a um grupo militar, com a função de fazer o Cordão de Segurança e a guarda do Rei da Irmandade do Rosário durante a procissão. O chefe é chamado de Capitão dos Pontões e é o responsável por marcar o ritmo, tanto na música como na dança, que em sua encenação lembra uma batalha. Em Jequitibá - MG, o nome do grupo similar aos Negros dos Pontões de Pombal é Guarda de Nossa Senhora do Rosário. Lá eles usam lanças enfeitadas nas cores brancas e azuis, sem as fitas coloridas ou maracás nas pontas das lança, mas os passos de dança são idênticos aos de Pombal, com algumas outras coreografias mais. Já em Caicó, o grupo é denominado de Negros do Rosário, e as lanças se assemelham mais à ocorrência em Jequitibá, Minas Gerais.

Aos sábados os Negros dos Pontões costumam visitar casas e a feira livre para se exibirem e recolherem dinheiro para a manutenção da Irmandade dos Negros do Rosário.
A solicitação de dinheiro é feita com o componente colocando sobre a cabeça do feirante a lança enfeitada com fitas coloridas, agitando ritmadamente os maracás, até que a pessoa faça a doação ou simplesmente agradeça a gentileza.

No dia da Procissão, o grupo acompanha o Rosário e faz a proteção do Rei e da Rainha em silêncio, sem dançar e sem tocar as maracas, como se a preocupação única fosse a prontidão para a defesa da corte real.

* Espontão é uma meia lança usada pelos sargentos da infantaria francesa no século XVIII e com uso idêntico na Idade Média.

Do livro "A Irmadade dos Negros do Rosário de Pombal" de Jerdivan Nóbrega de Araújo

Em primeiro plano a Igreja do Rosário de Pombal-PB.
Foto J.Tavares de Araujo Neto

O amigo Jose Tavares De Araujo Neto escrevendo em sua página, no FB nos explica um detalhe histórico dessas duas igrejas.


POR TRÁS DE UMA BELA IMAGEM, HISTÓRIAS DE SANGUE E PRECONCEITO RACIAL QUE ENVERGONHAM POMBAL

Em primeiro plano a Igreja do Rosário de Pombal, também denominado Igreja Nossa Senhora do Rosário, fundada em 1721, que originalmente se chamou Igreja Nossa Senhora do Bom Sucesso.

Esta foi a forma que os colonizadores portugueses encontraram para homenagear Nossa Senhora do Bom Sucesso, santa da Igreja católica, que jogou suas bênçãos para que os bandeirantes, sob o comando do capitão-mor Teodósio de Oliveira Ledo, chacinassem toda uma tribo indígena que morava no lugar.

Ao fundo, a atual Igreja Nossa Senhora do Bom Sucesso, fundada em 1872, que foi construída para substituir a antiga, em represália à decisão do bispo de Olinda, que autorizou que os negros pudessem frequentar a primeira.

Esta foi a forma que a elite branca de Pombal encontrou para respeitar a decisão soberana do bispo sem ter que passar pelo constrangimento de se misturar com os negros.

Tende piedade de nós!


quarta-feira, 27 de abril de 2016

Mestre Vitalino e sua Arte Popular


Nasceu em 1909 na vila de Ribeira dos Santos, perto da cidade sertaneja de Caruaru em Pernambuco, em criança modelava boizinhos, louças em miniatura e outros brinquedos para serem vendidos na feira local. 


Quem primeiro atentou para a criatividade e originalidade de sua obra foi o artista plástico Augusto Rodrigues (1913-1993) que no ano de  1947 o convidou a participar de uma exposição coletiva no Rio de Janeiro, 1ª Exposição de Cerâmica Pernambucana, com diversas obras suas e de artesãos e artistas populares pernambucanos, como Manuel Eudócio e Zé Caboclo. Eram todos desconhecidos ainda.


Depois da “estreia” no Rio de Janeiro, uma nova exposição, em janeiro de 1949, ampliaria a fama de Vitalino, desta vez no Museu de Arte de São Paulo (Masp). Dali em diante, sua trajetória acumularia momentos altamente consagradores.
Segue-se uma série de eventos que contribuem para torná-lo conhecido nacionalmente e são publicadas diversas reportagens sobre o artista, como a editada pelo Jornal de Letras em 1953, com textos de José Condé, e na Revista Esso, em 1959.

A Exposição de Cerâmica Popular Pernambucana foi um sucesso, e até hoje é considerada um marco na história do interesse pela arte popular, não só por revelar a obra de Vitalino, mas também por chamar atenção para a existência desse gênero de criação em diferentes regiões do país. 
A dura realidade do sertanejo nordestino da década de 1940 passava a ser conhecida e abordada por um caminho até então pouco usual: seus principais atores. Vitalino criou uma narrativa visual expressiva sobre a vida no campo e nas vilas do interior pernambucano. 

Fez esculturas tais, como “Violeiros”, “O enterro na rede”, “Cavalo-marinho”, “Casal no boi”, “Noivos a cavalo”, “Caçador de onça”, “Família lavrando a terra”, entre outras. 
“Eu, além de analfabeto, criei-me trancado vivo”, contou o Mestre a René Ribeiro, um de seus mais abalizados biógrafos. Essa difícil realidade, compartilhada com a maioria dos lavradores/artesãos de sua região, não impediu que o trabalho nascido nas cercanias de Caruaru desse, origem a um dos maiores polos produtores de artesanato figurativo popular no país.

Para explicar seu processo criativo, Vitalino utilizava o verbo “estudar” – ou seja, projetar e executar a obra, atividades também definidas por ele como “fazer no sentido”.  
“Estudei um dia de fazer uma peça… Peguei um pedacinho de barro e fiz uma tabuleta; do mesmo barro peguei uma talisca e botei em pé, assim; botei três maracanãs (onças) naquele pé de pau, o cachorrinho acuado com os maracanãs e o caçador fazendo ponto nos maracanã pra atirar”, descreveu.

Em 1955, integra a exposição Arte Primitiva e Moderna Brasileiras, em Neuchatel, Suíça. O Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais e a Prefeitura de Caruaru editam o livro Vitalino, com texto do antropólogo René Ribeiro e fotografias de Marcel Gautherot (1910 - 1996) e Cecil Ayres. 

Nessa época, conhece Abelardo Rodrigues, arquiteto e colecionador, que forma um significativo acervo de peças do artista, mais tarde doadas para o Museu de Arte Popular, atual Museu do Barro de Caruaru.
 Mestre Vitalino, em 1960, realiza viagem ao Rio de Janeiro e participa da Noite de Caruaru, organizada por intelectuais como os irmãos João Condé e José Condé, ocasião em que suas peças são leiloadas em benefício da construção do Museu de Arte Popular de Caruaru. 


Participa de programas de televisão e exibições musicais, comparece a eventos e recebe diversas homenagens,  como Medalha Sílvio Romero. Nessa ocasião, a Rádio MEC realiza a gravação de seis músicas da banda de Vitalino, lançadas em disco pela Companhia de Defesa do Folclore Brasileiro na década de 1970. Em 1961,  atendendo a pedido da Prefeitura de Caruaru, doa cerca de 250 peças ao Museu de Arte Popular, inaugurado nesse ano.

 Em 1971, é inaugurada no Alto do Moura, no local onde o artista residiu, a Casa Museu Mestre Vitalino. No espaço administrado pela família, estão expostas suas principais obras, além de objetos de uso pessoal, ferramentas de trabalho e o rústico forno a lenha em que fazia suas queimas.

A consagração de Mestre Vitalino foi, sobretudo, a consagração de um gosto e de um tipo de olhar sobre a realidade. Daí ter sido sua criação legitimada quase instantaneamente como “arte”.
Aplaudido por seus companheiros de Caruaru, transformou-se numa atração da feira da cidade. Foi homenageado em festas públicas importantes, tendo sido recebido com honras por governadores da antiga Guanabara, de Pernambuco, Goiás e Alagoas, e louvado em jornais, revistas e livros por escritores e poetas como Joaquim Cardozo, Manuel Bandeira e Hermilo Borba Filho.

Exemplares de sua obra foram adquiridos pelos principais museus brasileiros e por colecionadores particulares. O estudo de sua vida deu origem a publicações e teses. Após sua morte, ocorrida em 1963, seu círculo de influência se ampliou – ele foi convertido em personagem da cultura de massa. Mestre Vitalino foi o principal personagem dos enredos de várias escolas de samba no Rio de Janeiro. 

No carnaval de 1977, a Império da Tijuca apresentou “O mundo de barro do Mestre Vitalino”. 
No ano seguinte, a Mocidade Independente de Padre Miguel desfilou com o tema “Brasiliana”, no qual o escultor era citado. No desfile de 1982, a Beija-Flor cantou os versos de Wilson Bombeiro, Carlinhos Bagunça e Joel Menezes: “Mas Mestre Vitalino molda em barro o destino do povo tão sofredor”. 


E em 1983 foi a vez da Unidos da Tijuca, com o samba “Devagar com o andor que o santo é de barro”. Sua obra também inspirou os documentários cinematográficos “O mundo de Mestre Vitalino”, produzido por Armando Laroche (1953), e “Adão foi feito de barro”, de Fernando Spencer (1976). Em 1977, Geraldo Sarno filmou “Vitalino, Lampião”.

Embora se reconheça o papel fundamental de Mestre Vitalino na atenção que o universo da criação popular passou a receber, o fértil universo artístico surgido no Alto do Moura não foi obra de um homem só, nem fruto do acaso. Tratava-se de uma comunidade oleira, onde muitos dominavam as técnicas da cerâmica numa época em que começava a diminuir o interesse por objetos utilitários feitos dessa forma. 

A industrialização recente passava a oferecer louças e outros utensílios feitos de alumínio e de plástico, considerados mais atraentes e práticos. Com isso, os ceramistas tradicionais se viram pressionados a descobrir novos usos para seus talentos. Ao mesmo tempo, mudava o entendimento do que poderia ser admitido como arte e sobre quem poderia ser considerado artista.


Vitalino virou mito e personagem da cultura de massa, numa atualização do interesse que a temática sertaneja despertava no imaginário nacional desde o século XIX. De padre Cícero e Antônio Conselheiro ao fim do cangaço, com a morte de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, em 1938, os símbolos da cultura popular nordestina corriam o país e ganhavam as artes. 

Em 1953, o filme “O Cangaceiro”, de Lima Barreto, recebeu no Festival de Cannes, na França, o Prêmio Especial do Júri na categoria de melhor filme de aventuras. Até aquele momento, o filme foi a produção nacional de maior sucesso de bilheteria no Brasil e no exterior. 


Na literatura – que punha em xeque a erudição acadêmica, revelando a sofisticação presente na linguagem popular –, o exemplo paradigmático foi Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa (1956). A temática regional voltou a ter destaque no cinema em 1962, com a vitória em Cannes do filme “O pagador de promessas”, de Anselmo Duarte.


Vitalino não foi apenas um artista talentoso, também era músico e tocava numa banda de pífano. Entre suas virtudes, destaca-se a solidariedade dedicada aos seus companheiros, que foram os primeiros a reconhecerem-no como mestre. 



A consagração como uma espécie única tornou sua posição extremamente integradora, permitindo que amplos setores sociais reconhecessem e qualificassem positivamente, pela via das artes plásticas, um vasto contingente popular que até então raramente ganhava notoriedade.


Também contribuiu para desestabilizar estereótipos sobre o mundo rural, revelando homens de carne e osso que, por todo o Brasil, se dedicavam a atividades sensíveis e criadoras – da moda de viola à literatura de cordel, da criação de adereços para festas à produção de ex-votos, do entalhe em madeira à atividade artesanal cerâmica.

Fez jus à fama de mestre: foi um autêntico mediador, permitindo que os mundos erudito e popular, até então distantes, se encontrassem.
Onde encontrar Vitalino
O acervo de Mestre Vitalino está espalhado por diversos museus do Brasil e do exterior. Até o Louvre, em Paris, abriu espaço para as obras do ceramista. No Brasil, grande parte das obras está no Rio de Janeiro, em Recife e no Alto do Moura.


O Museu Casa do Pontal, no Rio de Janeiro, o maior e mais significativo acervo de arte popular do país, detém o maior número de obras do artista. Fica aberto ao público de terça a domingo, das 9h30 às 17h. O endereço é Estrada do Pontal, 3295, Recreio dos Bandeirantes. Telefones: (21) 2490-3278 e (21) 2490-4013. Na cidade, também abrigam obras de Vitalino o Museu do Folclore Edison Carneiro, o Museu da Chácara do Céu e o Museu Nacional de Belas Artes.



No Recife, o Museu do Homem do Nordeste, integrado à Fundação Joaquim Nabuco, abre às terças, quartas e sextas-feiras das 11h às 17h; às quintas, das 8h às 17h, e sábados, domingos e feriados, das 13h às 17h. O museu fica na Av. 17 de Agosto, 2187, Casa Forte. Telefone: (81) 44415500.
No Alto do Moura, comunidade de artistas que fica a sete quilômetros do centro de Caruaru (PE), funciona na antiga casa do mestre a Casa-Museu de Mestre Vitalino, administrada por um dos seus familiares. No local estão expostos objetos de uso pessoal do artista, fotos, suas ferramentas de trabalho, móveis e utensílios. No quintal fica o forno a lenha circular, para a queima da cerâmica. Telefone: (81) 3725-0805.

Fontes da matéria:

ABREU, Regina. O enigma de Os Sertões. Rio de Janeiro: Rocco,Funarte, 1998.

CABRAL DE MELLO, Paulino. Vitalino sem barro: o Homem. Rio de Janeiro:Fundação Assis Chateaubriand/MinC,1995.

COIMBRA, Silvia; MARTINS, Flávia e DUARTE, Letícia. O reinado da Lua – escultores populares do Nordeste. Rio de Janeiro: Salamandra,1980.

FROTA, Lélia Coelho. Mestre Vitalino. Recife: Fundação Joaquim Nabuco,Massangana, 1986.

Angela Mascelani - Diretora do Museu de Arte Popular Brasileira Casa do Pontal e autora de O mundo da Arte Popular Brasileira (Mauad, 2002) Revista de História 8/7/2009