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terça-feira, 30 de agosto de 2016

O CHAPEU DE LAMPIÃO

O chapéu de Lampião trazia diversas moedas e medalhas de ouro dentre outros adornos. 

Os motivos e as estrelas dos chapéus dos cangaceiros variavam muito e isso tinha que ver com o status de um cangaceiro para outro. Pelo tamanho e pelo ouro e medalhas de ouro dos enfeites, permitia-se fazer a comparação da importância que o mesmo tinha. Sabemos de cangaceiros ricos, tais como Zé Baiano, que emprestava dinheiro a comerciantes e fazendeiros e de importância como o chefe de seu próprio bando, Corisco, que através de suas indumentárias mostravam seu status no grupo. 

"Certos motivos, é possível observar nas fotografias, representam flores brancas cercadas de um círculo sobre fundo branco, como no chapéu de Lampião; outros parecem árvores estilizadas feitas de couro branco, ou como o chapéu de juriti e outros ainda, que representam estrelas brancas com oito ramificações sobre fundo negro, como o de Corisco. Todos esses chapéus eram enfeitados com medalhas e moedas. A base e as correias do chapéu de Lampião estavam de tal forma carregadas que um jornalista, descrevendo-as depois da morte do cangaceiro, diz que se tratava de uma "verdadeira exposição de numismática." - Citação da escritora Elise Grunspan-Jasmin em seu livro Lampião, senhor do sertão - Frederico Pernambucano de Melo faz referência à exposição de numismática citando o jornal paulista Diário de São Paulo de 31 de julho de 1938,

Após a morte de Lampião, as Forças Volantes apossaram-se de suas roupas e de seus acessórios. Essas roupas foram inventariadas e expostas, durante algum tempo, na caserna da Polícia Militar de Maceió, antes de serem expostas numa das vitrines do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. 

Eis a descrição do chapéu de Lampião dada pelo inventário montado em 26 de novembro de 1938, no quartel-general do regimento de Maceió, datilografado pelo aspirante Messias Ferreira da Silva e assinado pelo coronel T. Camargo Nascimento. O ato de inventário conserva-se atualmente no Instituto Histórico e Geográfico de Maceió, Alagoas.

CHAPEUDe couro, tipo sertanejo, ornado em alto relevo em suas abas, com seis signos de Salomão; barbicacho — de couro, com 46 centímetros de comprimento e ornado em ambos os lados com cincoenta e cinco (55) peças de ouro, de confecção variada, como sejam: botões para colarinho, para punhos e cartões tipo visita, com variadas inscrições, como "AMOR", "RECORDAÇÃO", "LEMBRANÇA" e "AMIZADE", e em alguns, um "P" como inicial e em outro "C.L", e mais três anéis, sendo um com pedra verde, outro uma aliança e o terceiro, um de identidade gravado o nome "SANTINHA"; 

TESTEIRAde couro com quatro centímetros de largura e vinte e dois centímetros de comprimento, onde estão afixadas as seguintes moedas e medalhas: duas com a gravação "DEUS TE GUIE", duas libras esterlinas, uma moeda brasileira de ouro com a efigie de "PEDRO II", de 1885, e ainda duas brasileiras de ouro, respectivamente de 1776 e 1802; 

BARBICACHO TRAZEIROde couro com as mesmas dimensões da testeira e ornado com as seguintes peças de ouro: duas medalhas com a inscrição da palavra "AMOR" e uma com a mesma inscrição e um brilhante pequeno e quatro outros de desenhos diferentes. 

Como percebemos na atualidade, o chapéu é o ponto principal para reconhecimento de um traje cangaceiro. É a fachada ostensiva. Em nosso encontros de discussão e conhecimento da história, encontramos amigos nossos, vestidos como cangaceiros onde o destaque principal é o chapéu. 

Foto do filme de Benjamin Abrahão
Frederico Pernambucano de Mello em seu livro Estrelas de Couro, referindo ao chapéu, nos fala das missões silenciosas, caminhando o bando por lugar aberto, sujeito a ser avistado de longe, ou entrasse em canoa para atravessar o São Francisco, Lampião advertia a tirar o chapéu. Era como que o único detalhe de se saber quem era cangaceiro fosse o chapéu. Era a condição de se ser cangaceiro. E ao tira-lo da cabeça, estavam  disfarçados de volantes e isso era estratégico. 

Foto do filme de Benjamin Abrahão
"Como expressão de arte, o chapéu tem vida própria, podendo ser lido, em seus aspectos estético e místico, com ou sem o geral da vestimenta... vistosos, ilhoses e circunstancialmente fitas, há de ser apreciado no conjunto que encerra em harmonia com a cabeça, não resistindo à decomposição. Os elementos, por si, ou são, no máximo, discrepâncias de padrões conhecidos milenarmente ou, pior, séries industriais, o que de mais fundo podendo arrancar-se de cada um destes não indo muito além do que vimos, salvo quanto a algumas sugestões adicionais ligadas à flora sertaneja. As fotografias depõem com eloquência. A foto, muito nítida, das cabeças de Lampião e seus homens, colhida na escadaria da Prefeitura de Piranhas, Alagoas, no dia mesmo do combate do Angico, apresenta treze chapéus arrebatados aos cangaceiros pela volante. Não há dois iguais. Tão ricos em tema e valor material quanto o do chefe, sim. O de Luís Pedro, lugar-tenente do bando, igualmente abatido, ilustra ambas as vertentes. O mesmo se diga quanto aos outros dois comentados, o de Zé Baiano e o de Corisco. Os demais, estando longe de ser pobres, rivalizam mais propriamente no que toca à estética. Registre-se ainda terem sido conjuntos notáveis, em todos os aspectos, os chapéus de Moderno, de Mariano, de Zé Sereno, de Gato, de Canário, de Juriti, de Balão, subchefes a serviço do capitão. E não se deixe de insistir no que ouvimos dos ex-cangaceiros Candeeiro e Barreira: que ao chefe ou subchefe, padrinho ou patrão, cabia enfeitar seus afilhados, sem exclusão dos riculutas [recrutas]. Os cabras sob sua direção, enfim. A tarefa consistindo não somente no fornecimento dos metais nobres, do pouco ouro e da alguma prata como vimos, mas também do auxílio na confecção dos ornatos. Nada rara a prática do padrinho confeccionar peça na intenção de presentear o afilhado. - Estrelas de Couro pgs 73-74.

Foto do filme de Benjamin Abrahão
E de onde vinha esses chapéus? O próprio autor de Estrelas de Couro nos fornece a resposta quando nos informa que eram confeccionados com couro de veado e vinham de Rio do Sal, povoação próxima a Paulo Afonso na Bahia e que eram confeccionados por mestre Duda, Joaquim Ribeiro dos Santos, casado com uma tia de Maria Bonita, irmã de dona Déa. As peças vinham apenas com a barbela de prender no queixo, deixando os enfeites para serem confeccionados em tempos de coito manso.