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domingo, 29 de dezembro de 2013

Boemia é em noite de dia qualquer

Deus me deu a vida para que eu a aproveitasse. Disso não duvido de jeito nenhum. Passei por certas situações e por certos lugares incríveis. Umas situações boas outras más e lugares maravilhosos e outros não tão cheios de beleza, mas que trouxeram tantas lições. 

Por conta das lembranças que afloraram hoje, lembrei Quando rapazinho, de está entre os amigos, naquele barzinho preferido de todos nós, em Fortaleza, na Rua Dom Joaquim com Pereira Filgueiras, o bar de "seu" Mizael. Noite de dia qualquer, no meio da negada, como se já homem fosse, participando numa roda de boêmios, cantando e sendo acompanhado com o violão do Titico, estudante de agronomia da velha Faculdade que ficava no final da Bezerra de Menezes, já próxima de Caucaia, inicio da estrada. 

Titico era desses boêmios jovens que não precisava que a gente dissesse: sabe essa? Pois ele tocava qualquer coisa e dedilhava com uma precisão tão grande, que às vezes nos esquecíamos de cantar pra ficar ouvindo e maravilhando-se dos acordes perfeitos extraídos por suas mãos mágicas. Como gostava da noite e de um violão!

Com certeza, fui iniciado no gosto, quando menino. Meus pais resolveram comprar um violão e contratar um professor para ensinar à minha irmã Ivanise, a quem chamávamos carinhosamente de Zido, a arte maravilhosa de tocar violão. Não me perguntem por que. Talvez alguém da família saiba. O certo era, que eu ficava assistindo as aulas e quando o professor ia embora, eu pegava escondido o violão e tentava repetir o que era ensinado.

Era muito combatido por minha mãe, pois já previra meu espírito boêmio e dizia: se já gosta de ficar no meio da rapaziada boêmia sem saber tocar violão, imagine tocando!

Quando chegavam os fins de semana, me aprontava e ia para a porta da casa do "seu" Cirilo e de "dona" Peta, para acompanhar a roda de chorinhos e sambas da velha guarda, que vinha de todos os locais da cidade, para participar do evento. 

Violões, cavaquinhos, pandeiros e outros instrumentos, nas mãos daqueles homens da estiva, ganhavam vida. Vez em quando, um deles levantava e ia lá atrás da casa, e eu curioso, sem saber por que, pois quando chegavam de volta, estavam com uma sariguela ou um pedaço de caju nas mãos. Mas um dia descobri. Eles iam dar uma bicada de pinga. Era o maior respeito, pois eram discretos e nunca vi um sair bêbado desses saraus.

Minha mãe tinha razão, eu já era um boêmio.