Artigos Variados

domingo, 30 de outubro de 2016

Os Olhos dos Pardais


Nos céus voam os pardais,
procurando registrar os protestantes,
e quente debaixo do sol,
aliviam-se dos dejetos que entravam suas gargantas em gritos.

Reprovam aqueles idiotizados,
Que pensam que representam,
Algo que suas mentes insanas,
Não conseguem ver e dormentes,

Procuram alívio na dor alheia.
A razão sempre benevolente,
Entranhas ressequidas e nefastas,
Absorvem palavras fátuas,


Que ressoam em nada,
Pois possuem os excrementos mentais,
Daqueles que nada fazem,
Suando impropérios dementes.

Raul Meneleu

10/09/16

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Rainha do Maracatu Az de Espadas

Rainha do Maracatu Az de Espadas
A Grande e Mais Famosa Rainha de Maracatus, chamava-se Benedito Wanderlan Custódio da Silva, ou simplesmente como o chamávamos, Benoit. Vice diretor do Ginásio Aluno João Nogueira Jucá, no bairro Mucuripe em Fortaleza, capital alencarina, no carnaval de ruas da década de 60, transformava-se. 


Segundo José Orestes Cavalcante, primeiro presidente do Maracatu Az de Espada, treze vezes campeão geral do carnaval de rua, falando sobre Benedito Wanderlan Custódio da Silva, o Benoit, professor de matemática, "alto e bonito, como a mais famosa rainha dos maracatus de Fortaleza. Era disputado por todos."

Mas seu passe era exclusivo. Sempre foi Maracatu Az de Espadas, seu reino de glória tão passageira, apenas nos dias de carnaval, não importava, era rainha bonita e faceira, disputada pelos maracatus. Nesses dias, era aplaudido em sua passagem, com seu leque de rendas brancas contrastando com sua pele enegrecida pela tintura de falso negrume e o batom vermelho, acentuando a linha de seus lábios, gingando na cadência do ritmo lento e triste, abanava-se e sorria para todos, mostrando seus dente alvos num sorriso mais cativante e inocente de uma rainha escrava dos contos de fadas do panteão de deuses africanos. Era linda!

´Rainha preta do maracatu, nesse teu rosto de falso negrume/ morre de gozo na renda do sol/ no pano feito pelo fio d´água / desse véu de noiva: bica do Ipu...´


Em seu disco ´Cauim´, gravado em 1978, o compositor e músico Ednardo, fez-se rainha de Maracatu cearense, pelo menos na capa de seu disco, com o rosto pintado de preto, exaltando as Rainhas de Maracatus, e as exaltando com esses versos. E entre elas estava a rainha de Maracatu mais famosa de Fortaleza, Benoit, negro duas vezes; pela cor natural de sua pele original e pelo negrume falso da tinta preta. Na vida real um Príncipe e na imaginária, uma Rainha. 


Calé Alencar
As rainhas de Maracatus sempre foram exaltadas. Quem não ouviu ´Dora, rainha do frevo e do maracatu / Dora rainha cafuza de um maracatu/..´ de Dorival Caymmi. 

No Ceará, podemos citar, dentre outros, Calé Alencar, que canta sobre o Maracatu com suas melodias, apresentando loas e estimulando os brincantes a cantar


Vixe Maria... quando de longe eu via as Balizas abrindo o desfile, marcando o passo ao lado do porta-estandarte e carregando as balizas entre os dedos, girando-as graciosamente, vestidos com coletes, turbantes, saiotes e com suas fantasias com as cores preta e branca de meu maracatu, ia ao delírio. Vendo o Porta-Estandarte marcando o passo e anunciando a presença do maracatu, meus olhos brilhavam, vendo aquele pano de veludo, com franjas cor de ouro e rendas brancas nas bordas, trazendo no centro, o símbolo bordado de um Az de Espadas, que identificava o meu maracatu, sim... exultava e aplaudia.

Como admirador dos índios, os via desfilando em filas indianas e ladeando o estandarte, com seus saiotes de penas de avestruz, brandindo seus tacapes, lanças e flechas. Me sentia um guerreiro. E aquelas negras baianas que desfilavam marcando o cortejo real, protegendo a corte e respondendo em coro as loas cantadas pelo macumbeiro, que tirava loas e incitava a massa de gente que aplaudia e gritava de alegria, sim, eu ia ao delírio, com meus olhos e mente fértil de menino. 

E aquela negra Calunga? Trazendo aquela boneca fetiche em seus braços, acalentando aquela criança negra? Figura mais significativa do Maracatu, representando um ser supremo que possui o poder de evocar antepassados. Segundo a tradição africana, é dedicada ao Orixá Omulu.
Era emocionante! 
E atrás vinham as negras do incenso, defumando para que os deuses africanos abrissem os caminhos daquelas balaieiras, conduzindo na cabeça seus balaios carregados de frutas e entre elas alguns dos símbolos do sertão cearense, a Pitomba e a Macaúba, lembrando as antigas escravas que vendiam nas ruas com seus cestos de palhas. 

'Eu vou eu vou e você não vai... apanhar macaúba no meu balai... Eu vou eu vou e você não vai... apanhar macaúba no meu balai... apanhar macaúba no meu balai, eu vou eu vou e você não vai, apanhar macaúba no meu balai, eu vou eu vou e você não vai...' E eu escutava, maravilhado, aquelas baianas dizendo 'balai' e eu já tinha em mente o modo de falar dos negros escravos e sua simplicidade em falar o português.

Os pretos-velhos, simbolizando a sabedoria e a experiência dos anciãos das tribos africanas, passavam com seus cachimbos de fumo. Até que o desfile chegasse para nós meninos ávidos para apreciar o mais importante do desfile; a Corte, representada pelo Príncipe, a Princesa, o Rei e a Rainha, figuras principais, em honra de quem o cortejo se apresentava com suas damas de honra.


Então vinha a Rainha do Maracatu Az de Espadas, o professor Benoit, do Ginásio Aluno João Nogueira Jucá, carregando seu cetro e o leque enorme, feito de penas de aves raras, seguro pelas mãos de um vassalo, que reverenciando a Corte, pairava seu abanar em torno de sua Rainha.

E lá atrás, o som emanava dos tocadores de surdos, bumbos, caixas e ferros tipo chocalhos, triângulos e ganzás, executando a marcação para o canto e a evolução do maracatu. E nossa querida Rainha do Maracatu Az de Espadas, passava sorrindo para nós meninos e adultos, com aquele sorriso cativante, entreabrindo levemente seus lábios vermelhos, pintados juntamente com seu rosto em um ritual africano, de deuses negros de sua cultura. 

Esse cenário não me sai da mente, ainda menino sou...

Nota: As imagens não são do Maracatu Az de Espadas (são raras) - estão na internet e através delas saúdo todos os maracatus de Fortaleza.



terça-feira, 11 de outubro de 2016

LAMPIÃO e o cordão de ouro da Baronesa de Água Branca

   
Quando Lampião estava regressando do assalto em Água Branca, onde invadiu e roubou algumas jóias e da Baronesa Joanna Vieira de Sandes¹entrou ele, de surpresa no pequeno povoado de Nazaré, em Pernambuco. Era a primeira vez que o fazia desde a sua saída para Alagoas em outubro de 1919. Os cangaceiros não molestaram ninguém pois vinham eufóricos pelos resultados obtidos no roubo de Água Branca.² 

Levaria a fama na vida e depois de morto, de ter efetuado um dos mais espetaculares roubos, quando invadiu o casarão que tive a oportunidade de conhecer e visitar, veja aqui imagens inéditas dessa visita, juntamente com minha esposa, por ocasião do Primeiro Encontro Cariri Cangaço nessa bonita e hospitaleira cidade. 

Mas não é sobre essa visita que quero trazer o amigo leitor para as portas do Casarão da Água Branca, e nem sobre essa visita inesperada de Lampião à pequenina Nazaré, inclusive com uma crítica da autora à respeito da tolerância que os nazarenos, incluindo Manuel Flor, tiveram por conta dessa ocasião, pois o leitor poderá ler em meu artigo Os dois lados do cangaço: o pitoresco e o agressivo .

A atenção que quero lhes trazer é sobre uma entrevista que fiz, por ocasião dessa nossa visita ao Casarão do Barão de Água Branca, (imagens inéditas do interior da mansão) Joaquim Antonio de Siqueira Torres³. O herdeiro proprietário desse patrimônio da história aguabranquense, alagoana e brasileira, senhor Inácio Loiola, descendente do Barão de Água Branca, afirmou que Lampião não tinha levado o cordão de ouro mais famoso desse assalto, juntamente com o crucifixo

Relatou-nos que Lampião levou a culpa, não da invasão e assalto que fez à Baronesa Joanna, que por certo lhe rendera frutos, quando invadiu sua mansão, mas  não de ter especificamente surrupiado tão valiosa joia, e que tal estava hoje nas mãos de uma pessoa que ele conhece. Por ocasião da invasão, tal cordão de ouro e medalhão, fora escondido por uma das pessoas cuidadora da idosa baronesa e que estava presente na ocasião do assalto, e que o escondera e tinha ficado com o mesmo, pondo a culpa no famigerado bandido.


Com essa declaração, o herdeiro do Barão de Água Branca faz uma colocação até hoje não levada em consideração pelos autores que focaram suas pesquisas nesse assalto. Até então, tudo que eu tinha lido, sempre mostrou Lampião como responsável pelo afano de tão famosa joia. Essa fotografia de Maria Bonita, com diversos cordões de ouro e medalhas, não apresenta tal crucifixo. O assalto ao casarão se deu em 1922 e depois de 8 anos, foi que Lampião conheceu Maria Bonita. Quase que impossível Lampião ou Maria ter esse crucifixo. Ponto para o descendente de Joaquim Antonio de Siqueira Torres, o Barão de Águia Branca.


O CASARÃO pede socorro 


Brasão da Família
Sua manutenção é urgente. Existe a Lei municipal nº 447/71 de 18 de abril de 2001, que dispõe sobre o Tombamento Municipal do Centro Histórico, Seus Entornos, Seus Monumentos Históricos e Ecológicos, publicada e registrada na Secretaria Municipal de Administração e Finanças da Prefeitura Municipal de Água Branca.

O Artigo 3º desta Lei diz que os bens do patrimônio público e particular situados nos limites da área tombada, ficam sujeitos, no pertinente a seu uso gozo, às normas que dispõe sua manutenção e preservação do patrimônio Histórico e Artístico estabelecidas nas legislações Estadual e Federal especificadas, bem como a preservação da Lei municipal nº 388/96 de 15 de agosto de 1996.


O artigo 4º desta lei diz que os Projetos de restauração e reforma de edificações considerados de valor histórico e artísticos, bem como os daqueles não classificados, observarão as diretrizes estabelecidas nesta Lei. Precisa-se aplicar a lei no que refere-se à manutenção e seus custos. Por não poderem mais sustentar a manutenção os proprietários estão vendendo o patrimônio por falta de ajuda para mante-lo. 

ACERVO ESPALHADO

Encontramos muitas peças em leilões, e quantas mais foram vendidas, espalhando-se o acervo de móveis, prataria, louças, etc. 



Livro "Louça da Aristocracia no Brasil"
autoria de 
Jenny Dreyfus
Em 13 de dezembro de 2004 houve um leilão, da Casa Dutra Leilões, onde foi exposto o seguinte objeto que fazia parte do acervo do Barão de Águia Branca, Barão de Água Branca. 

"Prato de porcelana sem marca, aba delimitada com friso azul entre filetes dourados; no centro da caldeira a legenda Barão de Água Branca sob coroa de Visconde em azul, pertencente a Joaquim Antônio Siqueira Torres; 23 cm de diâmetro. Apresenta fios de cabelo na aba. França, séc. XIX. 
Reproduzido à página 234 do livro Louça da Aristocracia no Brasil, por Jenny Dreyfus."

Outra peça leiloada:

Barão de Água Branca
Prato de porcelana sem marca; borda com friso azul entre filete dourado; ao centro a legenda Barão de Água Branca sob coroa de Visconde, pertencente a Joaquim Antonio de Siqueira Torres; 18,5 cm de diâmetro. Apresenta bicado na borda. França, séc. XIX.

Reproduzido à página 234 do livro Louça da Aristocracia no Brasil por Jenny Dreyfus.


Quanto ao Crucifixo que pertenceu à baronesa de Água Branca, hoje encontra-se em coleção privada, fechado a sete chaves, escondido do público, assim como as demais peças históricas do Casarão da Água Branca. 

Recentemente encontrei a seguinte notícia a respeito do crucifixo: "Em ouro maciço 22 quilates. Esta magnifica peça, segundo o Dr Orlins Santana de Oliveira Membro do Instituto Histórico da Bahia, Membro do Instituto Genealógico da Bahia, estava à venda em 2005 em Salvador. Foi vendido para fora do Estado por 12 mil reais. Um comerciante deve ter levado. Fiquei muito sentido pela perda do acervo do cangaço. Na época não tinha recursos para adquirir o mesmo. Salvador era o local mais perto para as volantes revenderem os achados. E tudo vinha pela via ferroviária." - Hoje faz parte de uma coleção particular conforme livro "Estrelas de Couro" de Frederico Pernambucano de Mello.

Vejam Sítio Histórico de Água Branca será tombado pelo patrimônio estadual


1 - Joanna Vieira de Sandes, 1ª Baronesa de Água Branca
Data de nascimento: 30 Dezembro 1830
Local de nascimento: Água Branca, AL, Brasil 
Falecimento: 27 Dezembro 1923
Família imediata:
Filha de Antonio Vieira de Sandes e Luiza Vieira de Sandes 
Esposa de Joaquim Antonio de Siqueira Torres, Barão de Água Branca. 

2 - O Canto do Acauã pg 155 2ª Edição.

3 - Joaquim Antonio de Siqueira Torres, Barão de Água Branca
Data de nascimento: 08 de dezembro de 1808
Local de nascimento: Pesqueira, PE, Brasil 
Falecimento: 29 de janeiro de 1878 
Filho do capitão Teotônio Vitoriano Torres e de Gertrudes Maria da Trindade.


4 - Página da Prefeitura de Água Branca.

sábado, 1 de outubro de 2016

Os dois lados do cangaço: o pitoresco e o agressivo.

"Regressando do assalto em Água Branca, Lampião entrou de surpresa em Nazaré. Era a primeira vez que o fazia desde a sua saída para Alagoas em outubro de 1919. Estava confiante no acordo de paz que propusera aos nazarenos através de "Sinhô" Pereira. De qualquer modo, os moradores do povoado estavam temerosos por se acharem desprovidos de armas e munições caso os bandoleiros quisessem efetuar vingança; todos sabiam o quanto Lampião era rancoroso e extremamente vingativo. 

Mas os bandoleiros não molestaram a ninguém, pois vinham bastante eufóricos pelos resultados obtidos no roubo de Água Branca. E neste ponto incidia o aspecto constrangedor e também comprometedor daquela visita. Manuel Flor relembrou aquele dia: "Dançaram muito a 'Mulher Rendeira', acompanhada do xaxado, que pela primeira vez presenciei, bem ritmado, em perfeita harmonia com a música. Tenho dúvidas se essa modalidade de dança foi criação do grupo de Lampião ou de Sebastião Pereira porque os principais dançarinos eram Baliza, Vereda, Mão-de-Grelha e outros veteranos de Sebastião. 

A dança foi realizada à tarde, sob uma quixabeira que à época existia no centro do povoado e a cuja sombra se realizava a feira. Foi um espetáculo que nos empolgou ver todos aqueles homens, chapéu de couro na cabeça, dançando e cantando

"Olé mulé rendêra 
Olê, muié rendá
Tu mí insina a faze renda 
Qui eu ti insino a namorá 
Olé mulé rendêra 
Olê, muié rendá 
Choro por mim não fica
Só si eu não vê chorá 
As piquena vai no bolso 
As maió vai no borná" 

Em Pernambuco, uma das primeiras pessoas a sofrer perseguição de Lampião, logo após o seu regresso de Alagoas, foi Clementino de Carvalho, abastado proprietário rural (era dono da fazenda Lagamar, situada às margens do Pajeú, entre Floresta e a vila de Santa Maria), Clementino compareceu à feira de Nazaré e o bando o aguardou nas imediações. Quando ele retornou  a trilha que o levaria de volta à fazenda, os bandoleiros investiram em sua direção; Clementino conseguiu safar-se graças à sua boa montaria, retrocedendo para o povoado em desabalada carreira. 

Os cangaceiros, no entanto, não estavam dispostos a perder sua valiosa presa e permaneceram à espera por longas horas nos arredores. A população do povoado ofereceu a Clementino Carvalho integral apoio, no sentido de evitar os vexames que o fazendeiro poderia sofrer nas mãos dos bandidos. 

Soube-se depois que Virgulino pretendia sequestrá-lo em troca de vultoso resgate; foi Lampião o primeiro cangaceiro a empregar o sequestro como meio de obter resgate em dinheiro — essa modalidade de crime era desconhecida no sertão pernambucano. 

Passaram-se vinte e quatro horas sem que Clementino pudesse regressar a Lagamar. Logo que a sua família foi informada do que acontecia em Nazaré, foi buscá-lo com uma escolta de vinte homens bem armados. Os cangaceiros chegaram a provocar a força de socorro, disparando suas armas; alguns dos mais audaciosos membros do grupo de Clementino fizeram menção de persegui-los mas foram impedidos pelo fazendeiro que não desejava mais violência. 

Em pouco tempo aconteceu a segunda tentativa de sequestro envolvendo outro rico fazendeiro dos Carvalhos, Florentino, dono da fazenda Entresserra, o qual foi submetido a cerco em sua propriedade. Apesar do forte tiroteio que marcou esse episódio, Virgulino teve mais uma vez frustradas suas intenções. Assim, os fazendeiros da região tiveram oportunidade de observar os dois lados do cangaço: o pitoresco e o agressivo."*

 * do livro O Canto do Acauã - Marilourdes Ferraz
O acauã é uma ave pertencente à ordem dos Falconiformes, da família Falconidae. É conhecida pelo seu canto característico e por se alimentar de serpentes.