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sexta-feira, 22 de julho de 2016

A PRESENÇA FEMININA NO CANGAÇO

Amigos, tomando emprestado uma parte do trabalho de ANA PAULA SARAIVA DE FREITAS - A PRESENÇA FEMININA NO CANGAÇO: PRÁTICAS E REPRESENTAÇÕES (1930-1940), vemos que os matadores de mulheres de cangaceiros foram impiedosos, para se dizer no mínimo, nos combates entre eles pois essas não eram belicosas, como a frase do matador de Maria Bonita, diz, se gabando como deu os tiros que a mataram: "...num dexa a bandida escapar... ela tá fugindo...!" exclamava o soldado para o soldado Panta de Godoy e esse em sua insanidade diz: "... atirei pelas costas e ela caiu..."


A morte de Maria Bonita foi de uma crueldade sem tamanho. O blog MULHERES NO CANGAÇO nos fala que "Nas Cruzadas da Idade Média a violência era menor."

Como sabemos hoje, por acompanhamento e estudos feitos por profissionais da comunicação e os da psicologia, a imprensa televisada, irradiada e escrita tem um poder muito grande de incutir nas massas o que eles querem. E não foi diferente o tratamento dado pela imprensa, às mulheres no cangaço. Vejamos a Dissertação apresentada a Faculdade de Ciências e Letras de Assis – UNESP, para a obtenção do título de Mestre em História (Área de conhecimento: História e Sociedade) da referida autora que falo no início desse artiguete:

"Praticamente na metade do ano de 1935, o jornal Estado de S. Paulo referindo-se à composição do bando do cangaceiro Zé-Baiano enfatiza que ele e seus homens “estavam acompanhados de quatro mulheres”. - O Estado de S. Paulo 22/05/1935, p. 7

Cerca de 3 anos depois. esse mesmo tratamento numérico, também permanece no contexto do Estado Novo. Em abril de 1938, três meses antes da morte de Lampião, o periódico noticiava: “o grupo era composto de 10 homens e 4 mulheres” - O Estado de S. Paulo 17/04/1938, p. 7.

E depois da morte de Lampião, já sob a garantia de anistia por parte do governo estado-novo, veiculava: “duas mulheres entregaram-se a polícia bahiana em Geremoabo” - O Estado de S. Paulo 09/12/1938, p. 5.

É significativo recuperar que apesar da inferioridade numérica, elas são sempre tratadas em pé de igualdade quando se refere à criminalidade.
Além da expressão “bandida”, também foram usadas pela imprensa paulista “amante” e “companheira” para se referir à mulher cangaceira, como exemplificam as frases: “a bandida amante do chefe Jurema” (O Estado de S. Paulo 12/03/1935, p. 7) e “companheira de Lampeão” - O Estado de S. Paulo 28/07/1935, p. 2.

Esta última, permanece mesmo após a morte do casal em julho de 1938 no cerco a Angico /Sergipe. Referindo-se à chegada das cabeças de Lampião e Maria Bonita ao Museu do Serviço Médico
do Estado da Bahia, o periódico enfatizou que “haviam desaparecido as obturações em ouro dos dentes de “Lampeão” e sua companheira” - (O Estado de S. Paulo 14/08/1938, p. 9. ).

Poucas são as matérias que expressam alguma positividade. Na notícia veiculada em 20 de maio de 1934, somos informados de que Lampião seria um homem viril e sedutor, pois “tinha duas amantes, ambas caboclas e bonitas” - O Estado de S. Paulo 20/05/1934, p. 8.

Contudo, ao longo da pesquisa pudemos perceber, a partir da análise dos documentos e dos depoimentos orais de ex-participantes, que a informação veiculada acima não traduz as relações existentes nos bandos, pois era permitido que os homens tivessem uma única companheira e vice-versa.

No que se refere ao desempenho com armas de fogo, as cangaceiras foram descritas da seguinte forma: “As três mulheres que integram o bando sinistro (...) são hábeis amazonas e manejam o rifle com incrível destreza. Algumas são tão cruéis quanto os homens. Tomam parte nos assaltos e combates ao lado dos bandoleiros, mostrando-se tão destemerosas como eles”. - O Estado de S. Paulo 13/01/1937, p. 7.

Nessa construção fica evidente que se constituíam em mulheres belicosas e perigosas. Em seus relatos orais, Sila e Dadá enfatizam que as mulheres quando incorporavam-se aos grupos, aprendiam a lidar com armas de fogo e punhais.

A historiadora Maria Cristina M. Machado, (As táticas de guerra dos cangaceiros. São Paulo: Brasiliense, 1978, p. 92. ) nos esclarece que na maioria das vezes as mulheres ficavam protegidas nos coitos e que não participavam ativamente dos confrontos, salvo no momento em que a perseguição policial tornava-se mais acirrada. Tal perspectiva transmite a idéia de legítima defesa, e justifica a prática feminina. Em sua concepção, com exceção de Dadá, a maioria das mulheres não possuía um perfil belicoso e violento.

A leitura de O Estado de S. Paulo nos mostrou que as cangaceiras foram qualificadas de forma homogênea como criminosas e bandoleiras construindo, assim, um estereótipo masculino, belicoso e violento de mulher, ou então, tratando-as como meros objetos de satisfação sexual, descrevendo-as como amantes ou companheiras dos homens.

E por fim, como números, sempre de modo depreciativo. Essa postura do periódico acabou por encobrir a própria condição feminina e o ser mulher criado no universo do cangaço. Os cuidados femininos com o embelezamento do corpo, com a aparência, foram anulados pela construção de uma identidade belicosa e marginal."

Como vemos, essa apresentação mostra claramente o poder da imprensa, em mostrar que as "cangaceiras" eram de uma periculosidade sem tamanho e assim convencer a maioria da população, que tais eram bandidas da pior espécie.

Interessante é, quando os bandos do cangaço foram desfeitos, e após as entregas, elas voltaram para casa e tornaram-se ótimas donas de casa, cuidadora de seus filhos. Não é Lili?