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terça-feira, 22 de março de 2016
Padre Frederico Bezerra Maciel e Lampião
Sim amigos, tenho grande admiração pelo Padre Frederico Bezerra Maciel.
Frederico Bezerra Maciel nasceu em Porção, em 22 de outubro de 1912. Fez o ensino primário no Colégio Diocesano de Pesqueira e depois foi para o Recife, onde cursou o secundário, no Colégio Nóbrega.
Aos 16 anos decidiu ser padre e seguiu para o Seminário Maior de Pirapora do Bom Jesus, em São Paulo. Em Friburgo, Rio de janeiro, entrou para o noviciado dos jesuítas e no Seminário de Olinda fez os estudos superiores de Filosofia e Teologia.
Depois de ordenado sacerdote secular, em 01 de março de 1942, na catedral de Santa Áqueda, em Pesqueira, Frederico, ávido de conhecimento, seguiu para a Europa, onde fez estudos de Sociologia, História da Arte e geografia Bíblica. Viajou pelo Oriente Médio, África e parte da América do Sul, em estudos bíblicos. Fez vários cursos: Sociologia, Arte, Técnica em Agricultura, Assistência Social, Parapsicologia e outros, era homem inteligentíssimo e humilde.
A sextologia "Lampião, Seu Tempo e Seu Reinado" desenvolvida por ele, onde mostra sua relação e atitude corajosa de defesa e compreensão ao Rei do Cangaço Lampião.
Sabemos, que até mesmo os mais sérios estudiosos do cangaceirismo tomaram atitudes e caminhos diferentes, em suas narrativas, embora no âmago histórico todos convirjam.
Vemos também esse desencontro até mesmo na ciência. Alguns estudiosos, como exemplo, da escola de Nina Rodrigues, das heranças e atavismos das teorias de Lombroso, e outros que invocaram a secura e a dureza dos elementos naturais como responsáveis pelo comportamento desumano daquele ser marginalizado, sempre em conflito com o meio social em que vivia, também se desencontravam em suas teorias.
Até mesmo um ícone da literatura, Euclydes da Cunha, em certa passagem de sua obra "Os Sertões" publicado em 1902 e que trata da Guerra de Canudos (1896-1897), no interior da Bahia, incidiria no excesso de considerar que a mestiçagem extremada era um retrocesso. O mestiço, traço de união entre as raças, disse, "é quase sempre, um desequilíbrio."
Padre Maciel não sustenta propriamente uma tese, pois dispunha-se apenas estudar e examinar os passos e ações de Lampião, na longa caminhada de revolta e do crime, e mesmo que discorde, assim como muitos, o fazia para absolvê-lo dos seus erros.
Sua posição era a de um autentico sacerdote piedoso, que perdoa os pecados, tanto mais se esses pecados eram resultado de uma vivência sofrida de uma vítima do infortúnio e da desgraça, numa sociedade que não tinha nem procurava ter os meios para atenuar as profundas injustiças que nela existia.
Nosso querido Padre Maciel, numa atitude que talvez até possa ser interpretada como explorando aspectos de reivindicação ou de simples luta de classes, nos brinda com sua posição de origem religiosa.
Acostumado à leituras da Biblia, que em suas páginas narra violentos conflitos provocados por ambições sociais e de poder, penso que procurou dar à sua avaliação e narrativa uma orientação no sentido de que esta terra antes de ser de promissão, é mais um vale de lágrimas, de durezas e misérias, mostrando que antes de condenar, tem-se que examinar os erros de cada um.
Não vejo o Padre Maciel como ingênuo, pois sua formação me permite visualizar através de seus cursos feitos na Europa e com uma larga experiência, junto às vigararias onde serviu, em várias paróquias do nordeste, uma atuação que se deparou com inúmeros casos sociais.
Tinha forte estudo psicológico e de vivência humana, não se podendo dizer, portanto, que a sua contribuição ao estudo do banditismo no nordeste seja fruto de um ponto de vista apaixonado. Não acredito nesse tipo de papel exercido por ele.
A prolongada permanência no Sertão, as confidências recebidas e as conversas que ouvia particularmente e no confessionário, só lhes eram feitas por ser um padre. Esses foram os recursos de que se utilizou, sem se afastar dos compromissos de honrar o voto confessional que fez em sua religião, para construir a sua tese e dar o seu vasto depoimento e para isso precisar de muitas páginas em seu livro, que de único passou a ser seis.
Por que esse homem era assim? Ao relatar aspectos de sua infância e juventude no Sertão, declarou textualmente: - "Parte de minha infância passei em Pesqueira, onde geralmente se concentravam as tropas para perseguição ao banditismo. As conversas na cidade giravam obrigatoriamente em torno da tropa ali sediada e das façanhas e desmandos do bando de Lampião. Era um 'Centro' de informações sobre a evolução do banditismo no sertão."
Vemos então que esses fatos marcaram a sua adolescência e muitas vezes talvez tenha perguntado "Por que Lampião era assim?"
Quando era seminarista, passava as férias no Sertão, no município de Triunfo, acompanhando o Sr. Bispo às Missões, em visitas pastorais e deve ter ouvido e visto muita coisa. Depois de ordenado, quatro anos após a morte de Lampião, foi designado para a paróquia de Tacaratu, que abrangia Petrolândia e Inajá (antigo distrito de Moxotó e Santo Antonio da Glória (na Bahia). Toda essa região (sertão baiano, Alagoas, Sergipe, Pernambuco), dentro do eixo do São Francisco, era percorrida a cavalo, para celebrar missas, fazer casamentos, batizados e efetuar confissões.
Conversava apenas, sem intenção de documentar, pesquisar ou escrever. Apenas como disse ele "Guardei de memória muitas dessas conversas, e tomava algumas notas, sem quebrar o sigilo dos nomes de pessoas e dos fatos que me eram revelados. Passei nove anos naquela região sertaneja e também em Flores e Carnaíba (Sul e Norte de Pernambuco). Viajei ainda pelo rio de Contas, Chapada Diamantina, região do Cariri e Rio Grande do Norte, Voltei, depois, ao Sertão, várias vezes, desde 1958, já residindo no Recife e, então com o intuito de pesquisar, tornei-me fotógrafo revelador de filmes, para melhor documentar tudo o que colhera sobre o banditismo, especialmente de Lampião."
Segundo o Padre Maciel, o livro, estava escrito desde 1943 e tinha 1.200 páginas, cerca de 33 fotografias e que foram perdidos nas cheias do Recife muita documentação.
Mesmo que alguns amigos digam que Padre Maciel colocou também seu coração nesse livro e admirava o cangaceiro e por isso seus relatos estejam cheios de romantismo, continuo a ter profundo respeito e admiração por ele.