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terça-feira, 15 de agosto de 2017

LAMPIÃO e a inversão de valores

Quando tinha por volta de 10 anos de idade, já gostava de ouvir as histórias que minha avó paterna contava. Chamava-se Leonízia. Era a nossa vovó Santa, esse apelido, ela tinha desde pequena. Quando ela sentava em sua cadeira de balanço na varanda de nossa casa, corríamos a sentar em sua volta, para ouvir suas histórias de vida, envolvendo sua família e casos de outras pessoas. Vibrava quando ela contava a respeito da invasão de Mossoró por Lampião e seus cabras e nos falava da visita que fizera à cadeia dos Paredões, para ver o cangaceiro Jararaca, juntamente com os curiosos da cidade.

Desde menino sabia que Lampião tinha sido um dos piores bandidos que agia em boa parte do nordeste brasileiro. Contava-se as estripulias que ele fazia em livros e jornais daquela época em que ele viveu e também muito depois, quando os jornais entrevistavam cangaceiros regenerados que tinham passado longos anos nas prisões da Bahia e de Pernambuco e também os atingidos por ele.

Todos eram unânimes em relatar os roubos, os saques, os sequestros, as carnificinas, os requintes de perversidades que Lampião fazia com verdadeiro terror às suas vítimas. Quem não se recorda dos soldados mortos friamente na cadeia da cidade de Queimadas na Bahia? Quem não lembra da brutalidade do bando em atacar a família Gilo na fazenda Tapera em Floresta, Pernambuco? Esses fatos foram testemunhados e estão em livros para quem quiser saber quem era esse bandido.

E por que agora existe essa inversão de valores em dizer-se que Lampião era herói? De onde vem esse branqueamento de sua perversa história?

Virgulino Ferreira, o Lampião, foi o maior bandoleiro nordestino, e porque não dizer; também guerrilheiro e estrategista? Isso não podemos negar.

Defendo que esse branqueamento da história perversa dele, deu-se a partir de 1964 com a ditadura implantada no Brasil, pelos militares, onde alguns brasileiros tornaram-se guerrilheiros para combater o regime ditatorial. Os comandantes dessa guerrilha, incentivaram seus comandados a lerem sobre Lampião, como foi o caso do líder guerrilheiro Carlos Marighella, que lutou contra a ditadura no Brasil. Isso pode ser visto pelo testemunho de Mário Magalhães, autor do livro "Marighella - O Guerrilheiro que Incendiou o Mundo" na página 396.

Também podemos verificar que um dos livros indicados ao famoso guerrilheiro Marighella, por outro líder guerrilheiro chamado Joaquim Câmara Ferreira, do Partido Comunista Brasileiro, foi o livro "As táticas de guerra dos cangaceiros" de Christina Matta Machado.

Marighella e Joaquim Câmara, admiravam o homem que tinha lutado em seis estados nordestinos e que suas táticas de colunas móveis, (elaboradas por Lampião), tinha resistido por quase 20 anos.

"Temos que ser como Lampião", repetiam para os demais guerrilheiros.

Até mesmo a organização de esquerda, a Inter-nacional Socialista, tentou por sobre Lampião a ótica da guerrilha. (A Era dos Extremos pág. 85 - Eric Hobsbawn) - E isso também não podemos esconder pois realmente ele era um excelente guerrilheiro.

Daí em diante, passou-se a erradamente falar-se de Lampião como sendo um líder social, coisa que nunca lhe passara pela cabeça, pois antes de matarem seu pai, Lampião já roubava, motivo esse que, passou a ser perseguido pela polícia.

Os crimes mais funestos de Lampião estão registrados, e não se pode esconder ou fazer que tais não existiram. Foram praticados com requintes de perversidade. Lampião nunca foi um paladino da justiça. Tornou-se ladrão e assassino no decorrer de sua vida. Lógico que não concordo com a forma como ele foi tratado tanto pela lei quanto pela justiça, antes dele se tornar o que se tornou. Mas daí achar que ele lutava pelo social? Lutava para o povo libertar-se do julgo dos coronéis? Vai uma boa distância!

Quando vejo postagens nas redes sociais, enaltecendo Lampião, falando que ele era contra o domínio dos ricos sobre os pobres, vejo que, esses que o defendem, não conhecem o mínimo de sua história. E se conhecem, estão desviando e criando uma verdade falsa, onde a própria história derruba seus argumentos. Talvez alguns o façam por ingenuidade, outros talvez propositalmente. Mas digam-me... a quem interessa perverter a história? Lampião é um mito e simplesmente não podemos dizer o contrário.

Foram mitos nos EUA o famoso Billy the Kid, mas era bandido - nunca a história o pintou diferente disso. Outro mito foi Jesse James, assaltante de banco... mas era bandido. Outro mito foi Butch Cassidy, que ao lado de Jesse James e Billy the Kid, brilhou como um verdadeiro mestre na arte de roubar bancos e trens. Eram bandidos. Outro mito foi o da dupla americana Bonnie and Clyde que também rendeu filmes romanceados contando a história real de Bonnie Parker e Clyde Barrow, um jovem casal de assaltantes de banco e assassinos que aterrorizaram os estados centrais dos Estados Unidos durante a Grande Depressão no país. Ninguém quis mudar a história deles.

Lampião era bandido. Ninguém irá conseguir mostrar o contrário, mesmo insistentemente, dizendo que ele era um homem voltado para causas sociais. 

Mesmo mostrando respeito pelas pessoas que insistem em afirmar que ele foi um revoltado com as injustiças que sofreu, e que em parte concordo, continuo a afirmar que Lampião era um bandido de alta periculosidade e que em vez de defender os mais pobres, aterrorizava-os com seus crimes hediondos. Era assim Lampião!