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quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Irmandades religiosas no Brasil: luta e resistência negra

Entende-se por movimento negro no Brasil as diversas maneiras de atuação por parte dos negros diante da ordem racista vivenciada no dia a dia. Neste caso, a Irmandade do Rosário dos Pretos, em Salvador, configura-se como uma das formas assumida pelo movimento negro ao longo de sua história de resistência. Constituindo-se enquanto grupo, esta irmandade religiosa compostas por negros em muito atuou como canal de acesso ao meio social brasileiro, bem como um espaço de reconstrução da identidade étnico-racial.

Independentemente da diversidade cultural encontrada no Brasil, no início de sua formação era impossível viver outra forma de manifestação religiosa que não fosse a católica. Para Portugal, a formação social do Brasil implicou, dentre outras coisas, na unificação moral e política das raças aqui presentes contra os “hereges” protestantes, representados em  figuras diversas.

Aos poucos, vários grupos étnicos, na tentativa de ocupar uma posição de prestígio na sociedade brasileira,começaram a experimentar em vários lugares públicos uma certa “intimidade”, com os santos católicos, forma  esta de se refugiar das punições estabelecidas pela estrutura social vigente na época.

No caso específico das experiências negras, apesar de terem se moldado à forma católica, traços culturais africanos se mantém ou re-significaram. Enquanto a colônia interpreta os cultos afro-brasileiros como uma forma profana de se adorar aos Deuses, informando ao Santo Ofício naquele tempo que se tratava de “folclore”, nada diferente dos dias atuais, onde é tratada como diversão e não como sagrado,  a população negra conseguiu preservar fatores centrais de continuidade de sua ancestralidade.

Estudos sobre o culto afro no Brasil fazem alguns pesquisadores  intuirem que, na experiência particular entre os elementos culturais africanos e os símbolos do catolicismo fatores estruturais  incidiram no fenômeno do “sincretismo”. Dessa maneira , as conformidades existentes entre os santos da Igreja Católica e os orixás do Candomblé além de terem ocorrido por força da imposição católica da época,decorreriam também das influências estruturais imbricadas nos símbolos religiosos.

Dentro desse contexto, a presença de negros nas várias confrarias religiosas é um dos indicadores desta postura da Igreja Católica, mesmo porque, não é de admirar-se que nessas condições o homem de cor reagisse no Brasil exatamente como nos Estados Unidos e que transformasse esse catolicismo do qual se queria fazer como um meio de controle social e de integração numa sociedade que o maltratava, num instrumento, pelo contrário, de solidariedade étnica e de reivindicação social.


Para a Igreja Católica, as irmandades foram um dos meios mais eficazes de converter ou até mesmo submeter diversos grupos étnicos, tais como índios, mouros e negros, ao catolicismo. Alguns estudiosos afirmam que, no Brasil, várias irmandades estiveram por muito tempo sob o controle da coroa portuguesa, submetidas à fiscalização do setor eclesiástico. 

As confrarias religiosas já existiam em Portugal desde o século XIII e dividiam-se em irmandades e ordens terceiras. Ao longo de suas existências, muitas irmandades negras foram elevadas à categoria de ordem terceira, como foi o caso da Irmandade do Rosário dos Pretos do Pelourinho. Atividades como empréstimo de dinheiro a juros para os membros integrantes das confrarias foram revividos no Brasil, primeiro por irmandades mais ricas, constituída por brancos  e depois copiada por outras irmandades.

É importante destacar que as irmandades religiosas compostas por negros, além de assumirem a assistência médica e jurídica, o socorro em momentos de crise financeira, e os funerais tanto de membros dessas associações quanto de seus familiares, também se responsabilizavam pela compra de alforrias de outros escravos.

A partir do compromisso, lei que estabelece os estatutos da organização e da sua aprovação pelas autoridades eclesiásticas, estas associações eram reconhecidas no meio social. Era obrigação de todos os membros dessas confrarias seguir à risca os seus mandamentos.

Contavam como requisitos básicos na sua estruturação a categoria sócio-econômica e a cor da pele. As Irmandades do Rosário, trazidas pelos jesuítas, foram as mais numerosas em todo o Brasil colonial, tradicionalmente dividida entre as de crioulos (negros nascidos no Brasil), mulatos e de africanos. Estas, como as demais confrarias religiosas, estruturavam-se em torno de uma mesa presidida obrigatoriamente por alguém da “raça”. Dentro dessa exigência, deveria ser escolhido um juiz ou presidente, no caso das irmandades, e um prior no caso das ordens terceiras.

A Irmandade do Rosário dos Pretos foi erguida e confirmada na Sé Catedral,  no inicio do século XVIII, entre 1703-1704. Os membros da confraria conseguiram levantar a sua própria capela às Portas do Carmo. Era de fundamental importância a obtenção de um espaço próprio para que fossem realizados tanto os rituais religiosos como as atividades sociais dirigidas ao negro. 

Durante grande parte do século XVIII, depois de sucessivas tentativas para a concessão de um terreno por  D. João V, é que se dá a construção da igreja, concluída em 1812. Ainda hoje, situada no Pelourinho, apresenta-se como um dos principais símbolos para a população negra da cidade.

Para se fazer parte da irmandade algumas qualidades básicas eram exigidas aos membros que se candidatassem para fazer parte da mesa das confrarias. De acordo com o compromisso de 1820, era preciso ser pessoa livre, para estar  apto, exercer e satisfazer os atos de Irmandade, livre de  qualquer infâmia a que está sujeita a condição servil.

Ressaltava que pessoas " sujeitas" poderiam exercer os cargos de mordomo da festa, desde quando pudessem cumprir suas obrigações e satisfazer as exigências econômicas de costume,assim como, serem Irmãos da Mesa desde quando tivessem bom procedimento e seu cativeiro fosse suave.

No entanto, acentuava que em nenhum caso, poderiam ser escravos, os elementos responsáveis pela direção da Irmandade, ou seja, juizes, escrivães, tesoureiro, etc. Os membros da mesa do Rosário dos Pretos deveriam, principalmente, ter boa conduta e ser reconhecidos socialmente, a fim de assegurar a confiança entre os demais integrantes da confraria.

Além dessas qualidades, os confrades deveriam possuir boas condições econômicas, pois era, sobretudo, através das contribuições materiais dos seus membros que as irmandades realizavam seus rituais fúnebres e festivos, ornamentavam sua capela, garantindo a ascensão social e econômica da irmandade e de seus membros.

Por conta disto, ainda hoje, a Igreja do Rosário dos Pretos no Pelourinho, apresenta-se como um dos lugares ou territórios no qual são revividas experiências culturais negras, constituindo-se fator de identificação para os movimentos negros, mesmo diante da  nova realidade religiosa. 

Durante a escravidão, as irmandades e outras expressões negras, representaram ponto central de encontro de cidadãos negros. A diversidade de elementos culturais africanos presentes no Brasil influenciou, a composição dessas organizações. É desse modo que percebemos o significado da Irmandade do Rosário dos Pretos do Pelourinho, enquanto movimento social da população negra, no passado, que ainda ressoa na atualidade.

Contribuição de Luciane Reis

As Irmandades Religiosas de Salvador Até o Século XIX

Foram várias às Irmandades religiosas na Bahia. Constituído para servir os irmãos e orientá-los nos seus problemas. Funcionava com objetivos sociais e de grande poder nas igrejas de suas confrarias.
Relaciono abaixo as mais concorridas:

Igreja da Barroquinha 

- Igreja de São Roque: Irmandade da Boa Morte, Rainha dos Anjos, composta de uma devoção das irmãs do  Martírios. Já existia desde 1851. E na mesma igreja tinha a Irmandade de Nossa Senhora da Angústia – composta de devotos brancos nacionais.

Igreja do Pelourinho 

– Nossa Senhora do Rosário – Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos. Quando foi feito o alicerce, no inicio do século XVI, os irmãos da confraria mandou vir de Portugal uma coleção de azulejos, cada parte colocado nas paredes laterais, representam; circuncisão, adoração dos Reis Magos, Rosário de São Domingos.

“A Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Quinze Mistérios dos Homens Pretos, foi festejada em 1811 na antiga Matriz de São Pedro (demolida) fundamentalmente religiosa católica, foi fundada em 1701 pelos irmãos proprietários de uma quadra no cemitério do Campo Santo, na área pobre, fora dos muros, nas encostas. Possui, no centro, pequeno monumento com um cruzeiro. É também conhecido como “cemitério dos escravos”. 

Capela dos 15 Mistérios edificada na esquina da Praça dos Quinze Mistérios no mesmo Bairro de Santo Antonio Além do Carmo.
Capela dos 15 Mistrérios e a Confraria de Nossa Senhora dos 15 Mistérios dos Irmãos Pretos.

Irmandade de Santo Antonio de Categerona, fundada em 1699 na Igreja de São Pedro (demolida) como também tinha a Irmandade de São Pedro Velho – devotos brancos e as Irmandade de S. Sacramento e Irmandade do Senhor do Mártires fundada em 1764.
Constituiram em 1689 até 1746 a Irmandade do Rosário dos Pretos.

Enquanto era associação étnica, formada pelos africanos benguelas, vindo  da região sul de Angola, que dividiam com os jejes da região do Daomé os cargos da mesa diretora Por desentendimento com o vigário. Teria iniciado a construção da Capela na rua grande de São João Pereira Guimarães, ficando conhecida como Irmandade do Rosário de João Pereira em 1784.

Igreja de São Francisco – Irmandade de São Benedito já existia o culto de São Benedito antes de 1623 – Devotos brancos que criaram a Irmandade de José de Ribamar na  Igreja do Corpo Santo fundada em 30 de agosto de 1891.

Igreja da Conceição da Praia – Irmandade de Nossa Senhora da Conceição da Praia – devotos, os portugueses.

Igreja de Brotas – Irmandade do Senhor da Cruz – devotos, os pardos.

Igreja de Nossa Senhora da Sant’Anna – devotos, todos os crentes.

Irmandade do Santíssimo, Passos e Carmo. Na Igreja do Carmo – Santo Antonio Além do Carmo – exclusivamente de brancos.

Irmandade de Santa Efigênia e de Santo Elesbão – devotos, os pretos e pardos.

Irmandade do Senhor Bom Jesus da Redenção – composta de pretos africanos da Capela de São Pedro Gonçalves S. Telmo, vulgarmente conhecido como Igreja do Corpo Santo. Devotos, escravos marinheiros.

Filial da Matriz da Igreja da Conceição da Praia, dita no livro como a 2ª igreja construída na Bahia. ( Fonte do livro: Padre Manuel Dendê Bus – Figura do movimento libertador de 1822 – vigário da Conceição da Praia.)

Em 3 de maio de 1752, alguns negros gêges instituíram na Igreja do Corpo Santo, filiada a Igreja Matriz da Conceição da Praia. A Irmandade do Senhor Bom Jesus das Necessidades e Redenção com a aprovação de D. José Botello de Matos, 8º Arcebispo da Bahia. Criou-se assim a Irmandade de Nª. Sª. Do Rosário dos Pretos da Praia. 

Era gosto dos devotos constituirem Irmandades nas Igrejas. Todas as Irmandades tinham que seguir às ordens do Arcebispado, mesmo que as confrarias fossem regidas por estatutos. As Irmandades arrecadavam dízimos dos seus participantes para reverter nas próprias necessidades dos irmãos. Era o que acontecia nas Irmandades em que figuravam os negros escravos ou forros. Mas, muitas confrarias sucumbiram no decorrer dos anos, pelo simples fatos do poder financeiro dos associados caírem e houve também a descrença de vários componentes das Irmandades com a Igreja. 

Perdeu-se a verdadeira característica que fora a abolição dos escravos e a importância que os irmãos tinham na sociedade, isto só aconteceu depois da libertação total dos escravos.

Como a Bahia era a Capital mais católica do país, restou muitos católicos brancos e poucos católicos negros. Só aqueles negros que foram criados e trabalharam nas instituições religiosas católicas é que mantiveram as suas crenças na Igreja. Outros voltaram as suas crenças de origens e a maioria ficaram com as duas religiões a católica e a africana.

Hoje temos pouquíssimas confrarias, a mais famosa ainda é a Irmandade do Rosário dos Homens Pretos. Continua na Igreja do Rosário na ladeira do Pelourinho, sua morada maior aonde se abraça todos os santos negros descendentes de africanos.

É BOM SABER: No dia 20 de março de 1788 na Quinta feira Santa teve incêndio na Igreja da ORDEM 3ª DO CARMO. O incêndio foi total da Igreja e com ela todas as alfaias e mais objetos que ornavam o primeiro templo. A Venerável Ordem 3ª do Carmo foi constituida em 19 de outubro de 1636 sua padroeira Santa Tereza de Jesus. A Igreja foi lançado a 1ª pedra no alicerce da Sacristia em 30 de outubro de 1709 e não se sabe quando finalizou a obra. (Fonte: Estatuto da V.O.3ª do Carmo)

Contribuição de Álvaro B.Marques