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segunda-feira, 22 de abril de 2013

Maracatu Ás de Espadas e sua Rainha


Eu era um menino feliz e traquinas. Só era bagunceiro como quase todo rapazinho.
De tão traquinas que era, perdí o ano letivo do primeiro ginasial naquela época por duas vezes pois bagunçava demais. Os padres do Colégio Castelo Branco, na Avenida Dom Manoel, por não mais suportar tanta rebeldia sem causa, chamaram meu pai pra dizer-lhe que não me queriam mais lá, mesmo sabendo que eu era um menino muito inteligente, mas só que não estudava fazendo as lições de casa.
 
Eu era o ajudante de classe do Professor Müller, alemão da cidade de Sarre, que falava e ensinava francês e eu era o melhor aluno dele, pois escrevia muito bem no quadro negro, que naquela época também já era verde. O Professor Müller ficava fulo de raiva quando outros rapazes tão bagunceiros quanto eu, faziam a suástica nazista no quadro, com giz branco. Eu não participava disso. Gostava demais desse professor que dizia que nos tempos da primeira guerra e da segunda, ora Sarre era da França, ora era da Alemanha, dizia ele para nós rapazes que tínhamos escolhido o francês, em vez da língua inglesa.
 
Meu Pai, que Deus o tenha, (clique aqui pra ver fatos da história do Brasil em que ele participou muito novo) homem de caráter e fibra, mesmo sabendo que eu era um traquinas, pois ele quando viajava me levava em sua companhia, para não deixar que eu "aperreasse" minha mãe nem meus irmãos e por não aceitar a minha, vamos dizer, expulsão do colégio, disse ao padre Gerardo, que Deus também o tenha, que tudo bem, aceitava a decisão da diretoria do colégio, mas que tiraria também o outro filho, que estudava lá também, o Meneleu Filho.
 
Me matriculou no Colégio João Pontes, colégio particular também e a meu irmão, matriculou-o no Colégio Juventus, também particular. Acho que deve ter separado a gente para o Chico não se tornar bagunceiro como eu. Quando levei "bomba" pela terceira vez, meu pai não se conteve e disse para minha mãe arranjar um colégio público para eu estudar.
 
Foi aí que fui matriculado no Ginásio Aluno João Nogueira Jucá, no bairro do Mucuripe em Fortaleza, cujo diretor principal era o saudoso e querido Padre José Nilson de Oliveira. Seu auxiliar na condução administrativa do Ginásio era o também saudoso Professor Benoir, que não sabia, era a Rainha do Maracatu Ás de Espadas, que eu era e sou ardoroso fã, pois assim como os demais maracatus (Ás de Ouro, Ás de Paus, Leão Coroado entre outros) me trazia admiração cultural dos negros da áfrica que trazidos para o Brasil, inventaram essa modalidade de apresentação carnavalesca.
 
Como podia reconhecer tal Rainha tão querida pelos foliões Fortalezenses? Destoado de sua fantasia, de sua pintura negra no rosto, dos adereços das rainhas africanas, de seu grande leque, se abanando graciosamente na avenida onde se cantava: "eu vou eu vou e você não vai, apanhar macaúbas no meu balaio, apanhar macaúbas no meu balaio, eu vou eu vou e você não vai."

E o som do batuque dos surdos, bumbas, timbaus, atabaques e triângulos trazendo o feitiço dos escravos africanos para a enfeitiçada multidão que admirava o Maracatu Ás de Espadas.

As baianas com suas saias rodadas e enfeitadas de balangandãs, com seus balaios carregados de macaúbas, pitangas, carambolas, bananas, mangas e os cachos de pitombas arriados displiscentemente de propósito nas laterais dos cestos cheios, representando as negras fazendo suas vendas de frutas dos quintais para os "Sinhozinhos e Sinhazinhas".

Os índios, enfeitados com longas penas e saiotes de palha e penas, enfeitados com adereços indígenas, com tacapes e machadinhas às mãos, dançado e pulando como se pra guerra contra os brancos fossem.
 
Impossível reconhecer tal Rainha! Só soube depois de alguns tempo. Se eu já admirava o Professor Benoir, pela sua inteligência e desenvoltura de resolver os problemas do Ginásio Aluno João Nogueira Jucá, que hoje se chama Colégio Padre José Nilson, fiquei mais ainda fã do Maracatu Ás de Espadas.

Tem um artigo de Marciano Lopes em que ele diz: "Passou o carnaval que passou e passou Benoir, a rainha das rainhas, disputados por todos os maracatus, mas, com passe exclusivo do Ás de Espadas, que já passou..." isto é, já passou na avenida.

Tem o artigo do Sérgio Pires que diz: "Ao falar dos antigos carnavais seu Geraldo (Geraldo Barbosa e o Maracatu Reis de Paus, fundador da agremiação) esclarecia a presença de índios nos maracatus cearenses. ´Lembro dos ´caboclos´ desfilando no carnaval de Fortaleza. Eram homens casados, com belas fantasias de penas de ema. Coisas bonitas. Depois eles foram para os maracatus e formaram os cordões dos índios´. De memória citava também as grandes rainhas. ´O professor Benoir, do Az de Espada, Zé Brás, do Rancho Alegre, Leão Coroado, Az de Espada, Az de Ouro e Rei de Paus, o Afrânio Rangel, majestade do Estrela Brilhante, Leão Coroado e Az de Espada, e o Zé Rainha´".

Professor Benoir, eis meu tributo à sua memória.

 
Nota: João Nogueira Jucá continua ser lembrado em Fortaleza. Esse heroi tem seu nome ligado à educação. (Clique aqui)